Senado pode rever dispensa de visto para estrangeiros entrarem no país
São Paulo – A liberação da necessidade de visto para turistas norte-americanos, japoneses e australianos, sem nenhuma contrapartida benéfica ao Brasil, conforme negociado nos últimos dias, está sendo questionada no Senado Federal. A ação do presidente Jair Bolsonaro (PSL) faz parte de uma tentativa de agradar os Estados Unidos, especialmente o presidente Donald Trump, com quem Bolsonaro tem afinidade ideológica.
“Não é aceitável que um nacional norte-americano tenha visto liberado para vir ao Brasil e os brasileiros não tenham o mesmo direito a ir aos Estados Unidos”, disse o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O parlamentar apresentou ontem (19) o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 68/2019 para sustar a medida de Bolsonaro, que joga fora anos de ação diplomática brasileira pautada no princípio da reciprocidade.
Bolsonaro disse, em discurso nos Estados Unidos, que é o primeiro presidente desde a redemocratização que não é “antiamericano”. Ele também chegou a dizer que “a maioria dos imigrantes não tem boas intenções”, do que recuou horas depois. A realidade é diferente da imaginada pelo presidente. O Brasil sempre nutriu uma relação saudável com os Estados Unidos. Visitas são de praxe: todos os presidentes pós ditadura civil-militar foram ao país. Lula, Dilma Rousseff, Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor de Mello, inclusive, receberam chefes daquele país no Brasil.
Entretanto, o que é inédito é a postura de colônia, adotada por Bolsonaro. “Me parece que a Austrália, Canadá e Japão só entraram de contrabando aí, para justificar a subserviência do governo brasileiro, do presidente da República, não ao governo norte-americano, mas em especial ao senhor Donald Trump”, completou Randolfe. No mesmo encontro, Bolsonaro cedeu a base aeroespacial de Alcântara, no Maranhão, para uso dos Estados Unidos, sem que o Brasil tenha acesso ao que será feito no local.
O presidente justificou a medida do cancelamento do visto como a fim de estimular o turismo. Randolfe questiona: “Ora, se é para mobilizar o turismo, vamos abrir para todos, toda a comunidade europeia, para a Rússia, para a China, para a Índia, para todos”. Norte-americanos representam o segundo povo que mais vem ao Brasil, com queda de 28% desde 2014. Em 2017 foram 475 mil turistas, frente a 2,2 milhões da líder, Argentina. Japoneses ocupam a 18ª posição, com 60,3 mil turistas. Canadenses e australianos não estão nem entre os 20 principais grupos.
De imediato, a medida também representa um prejuízo para o governo brasileiro de R$ 60,5 milhões por ano, que deixam de ser arrecadados em vistos, de acordo com o Itamaraty. Em 2018, o Brasil emitiu 258.437 vistos para turistas dos quatro países beneficiados por Bolsonaro.
Para o senador Eduardo Braga (MDB-AM), o Parlamento precisa estudar a medida, para que não prejudique a imagem do país na diplomacia internacional. “É preciso entender as contrapartidas da liberdade que daremos, e que ganhos o povo brasileiro terá em troca desta abertura (…) o Brasil precisa ser ouvido e nós precisamos ter a capacidade de negociar através da diplomacia ganhos efetivos para o povo”, disse. Hoje, brasileiros pagam mais de R$ 600 reais em um visto para os Estados Unidos, além de toda a burocracia alfandegária extremamente rígida.
O presidente da Comissão de Relações Exteriores e da Defesa Nacional no Senado, Omar Aziz (PSD-AM), pediu cautela e fez uma defesa da soberania nacional. “Nós queremos ter um bom relacionamento com todos os países do mundo, não é só com os Estados Unidos. Eles são um grande parceiro comercial, mas eu não acredito em bondade americana. Os Estados Unidos são pragmáticos, aquilo que interessa eles vão fazer, independentemente de ter relações ou não. Nós faremos questão de debater, até porque o Brasil tem que ter sua soberania”, disse.
Pelas redes sociais, a equipe do ex-presidente Lula publicou uma foto sua com o ex-presidente norte-americano George H. W. Bush, com a descrição: “A guerra de Lula foi para reduzir a fome do povo brasileiro. Não para embarcar em aventura militar dos Estados Unidos. E isso não impediu o Brasil de ter boas relações com os presidentes norte-americanos ao mesmo tempo em que ampliava as relações com a China, América Latina, África e Europa. Foi o melhor momento do Brasil no mundo”.
Rede Brasil Atual