TOCA DO LEÃO

Cordel para Bananeiras

Postei no meu Twitter: “Não positivei para o Covid, e sim para o covarde. Dez meses escondido na toca, com medo da infecção”. Lógico que só quis pegar carona no joguinho de palavras. Trata-se de prevenção. Com muita delicadeza, o destino me empurrou para as serras gerais do brejo paraibano e me vejo hoje habitando provisoriamente em uma colina no espinhaço da serra da Borborema, cercado de vales profundos e estreitos onde correm os riachos Curimataú, Dantas, Picadas, Sombrio e Carubeba, dominados pelo rio Bananeiras que deságua na cachoeira do Roncador. O rio nasce em matas preservadas no campus da Universidade Federal da Paraíba. Passageiramente, filio-me à cidadania de Bananeiras e Solânea. Meu refúgio localiza-se entra as duas comunidades.

Para preencher os dias de reclusão, gravo diariamente um programa de rádio, a “Rádio Barata”, e escrevo cordel. Meu trigésimo cordel fala da minha cidade recém adotada. “Neste livrinho pequeno e delicado cabe o universo e, principalmente, nosso mundo particular”, idealizei, ao lançar o “Cordel para Bananeiras”, contando a história da terra do poeta João Melquíades Ferreira, um cordelista de escol neste gênero literário, um sujeito considerado pelos estudiosos como o bardo que renovou o cordel.

O cordel faz um passeio pela história desta cidade de 21 mil habitantes, situada na região do brejo paraibano, burgo que já foi o maior produtor de café do Nordeste até o começo do século vinte, o que o tornou a cidade mais rica da região, expressa ainda hoje na arquitetura dos seus oitenta casarões até agora preservados.

O seu núcleo urbano

Surgido de sesmaria

Começou em priscas eras

Quando o século nascia

Já na era dezessete

Não se sabe mês e dia

 

Uma facção bravia

De arrojados pioneiros

Explorou essas colinas

E seus cenários brejeiros

Vindos lá de Mamanguape

Nobres e aventureiros

 

Coriolano Medeiros

Grande historiador

Garante que Bananeiras

Tem como desbravador

Mestre Domingos Vieira

Seu primeiro morador

 

Era dono e condutor

Da distante sesmaria

Que com Domingos Vieira

Foi precursor e seu guia

Arquitetando o arcabouço

Da vila que aqui surgia

 

Na gleba rica e vazia

Escolheram uma lagoa

No fundo de um verde vale

De água limpa e boa

Cercada de pacoveiras

Qual verdejante coroa

 

Pacoveira hoje abençoa

E dá nome a esta cidade

Se trata de uma banana

De azedia densidade

Imprópria ao consumo humano

Mas, por sua quantidade

 

Mostrou-se com qualidade

Para dar nome à vila

Bananeiras batizada

O povo logo assimila

Sua riqueza amplifica

O seu nome então rutila

 

Começa assim o “Cordel para Bananeiras”, visão retrô com fatos e pessoas que moldaram a terra do Barão de Araruna, Santos Estanislau, Aragão e Melo, Ascendino Neves, Monsenhor Pedro Anísio, Clovis e Odon Bezerra, Apolônio e Humberto Nóbrega, Solon de Lucena, Adolfo e Celso Cirne, entre outros vultos ilustres.

 

“Cordel para Bananeiras” na íntegra: https://www.recantodasletras.com.br/cordel/7153201

Fábio Mozart

Fábio Mozart transita por várias artes. No jornalismo, fundou em 1970 o “Jornal Alvorada” em Itabaiana, com o slogan: “Aqui vendem-se espaço, não ideias”. Depois de prisões e processos por contestar o status quo vigente no regime de exceção, ainda fundou os jornais “Folha de Sapé”, “O Monitor Maçônico” e “Tribuna do Vale”, este último que circulou em 12 cidades do Vale do Paraíba. Autor teatral, militante do movimento de rádios livres e comunitária, poeta e cronista. Atualmente assina coluna no jornal “A União” e ancora de programa semanal na Rádio Tabajara da Paraíba.

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