Líderes religiosas divulgam manifesto contra ‘PL do estupro’
O documento contou com a assinatura de 155 mulheres representantes de várias igrejas cristãs
Um grupo de mulheres líderes religiosas divulgou um manifesto contra o PL 1904/2024, projeto que equipara o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio e abre brecha para que estupradores tenham pena menor do que suas vítimas. O documento contou com a assinatura de 155 mulheres representantes de várias igrejas cristãs. Leia a nota na íntegra:
MANIFESTO DA FRENTE DE MULHERES DE FÉ PELO ARQUIVAMENTO DO PL 1904/2024 – PL DO ESTUPRO E DO ESTUPRADOR
Erga a voz em favor das que não podem defender-se, seja a defensora de todas as desamparadas. Erga a voz e julgue com justiça; defenda os direitos das pobres e das necessitadas. (Provérbios 31.8,9)
Somos mulheres de fé de variadas igrejas cristãs: evangélicas, católicas romanas, batistas, episcopais anglicanas, presbiterianas, luteranas, metodistas, pentecostais. Somos mulheres líderes: bispas, pastoras, diáconas, missionárias, catequistas, religiosas consagradas, lideranças comunitárias. Somos as herdeiras das mulheres discípulas que sustentaram com alegria e fé o movimento de Jesus nazareno. Somos as herdeiras das primeiras testemunhas da ressurreição. Somos igualmente as herdeiras das que foram queimadas pelas fogueiras das inquisições em nome de um “Deus Senhor” e da institucionalidade clérigo-eclesiástica.
Exercemos cotidianamente o nosso discipulado de iguais acolhendo pessoas discriminadas e perseguidas por aqueles que acreditam num deus da guerra. Somos mulheres batizadas que assumem o sacerdócio geral de todas as pessoas que creem. Por isso, invocamos a autoridade que nos é conferida pelo Batismo e dizemos NÃO ao PL 1904/2024 – PL do Estupro e de todos os abusadores dos corpos sagrados das mulheres.
• Exigimos o arquivamento do PL do Estupro e do Estuprador em nome das 252.786 meninascriança, que foram forçadas a dar à luz entre 2010 e 20191 por terem sido abusadas por seus pais, padrastos, tios, sacerdotes, pastores, padres, missionários, primos, vizinhos, avôs, irmãos.
• Exigimos o arquivamento do PL do Estupro e do Estuprador em nome das 179.676 meninas negras e das 8.099 meninas indígenas obrigadas a gerar outras crianças, entre 2010 e 20192 , porque temos um Estado que nega a elas o direito à infância e à proteção. • Dizemos não ao PL do Estupro e do Estuprador porque não aceitamos que mulher nenhuma seja encarcerada por interromper uma gravidez. Não consentimos que o patriarcalismo cristão sexista católico e evangélico obrigue o Estado a castigar mulheres e meninas porque projeta em seus corpos sentimentos reprimidos, insatisfações, incoerências, frustrações e perversões.
• Dizemos não ao PL do Estupro e do Estuprador porque temos como referência o Evangelho da liberdade e da justiça para mulheres e homens, crianças e vulneráveis na sociedade. Foi para a liberdade que Cristo nos libertou (Gálatas 5:1); não permaneceremos sob o jugo da escravidão de um discurso religioso funesto.
Dizemos não ao PL do Estupro e do Estuprador porque quem estupra despeja a violência no corpo das meninas e das mulheres e não aceitamos que essa violência seja institucionalizada.
• Dizemos não ao PL do Estupro e do Estuprador porque ele é um disfarce que esconde, não a luta em defesa da vida do não nascido, mas a legalização do ódio contra mulheres que denunciam as desigualdades, o racismo, a LGTBfobia, o desprezo contra as pessoas pobres. O PL do Estupro e do Estuprador é um PL de morte porque crucifica inocentes.
Denunciamos as alianças patriarcais entre religião e partidos políticos que negociam nossos direitos em troca de votos.
• Denunciamos sacerdotes, pastores e bispos que abusam de meninas, meninos e mulheres cotidianamente nas igrejas e depois as/os coagem a silenciar. Exigimos que o Estado, ao invés de permutar e se aliar com grupos religiosos, investigue de maneira isenta e sem exceção os religiosos abusadores.
Repudiamos qualquer Projeto de Lei que retire direitos das mulheres em qualquer âmbito. Não aceitamos que as Convenções e os Tratados Internacionais ratificados pelo Estado Brasileiro sejam descumpridos e banalizados. Não aceitamos o retrocesso dos direitos humanos assegurados na Constituição Federal de 1988. Estamos vigilantes e organizadas para combater qualquer iniciativa que ameace os direitos adquiridos das mulheres.
• Reivindicamos que a laicidade do Estado se torne princípio inegociável. Não aceitamos mais que profissionais da saúde sejam coagidos e criminalizados por homens que se valem de sua autoridade religiosa para normalizar o ódio às mulheres.
• Reivindicamos que o Estado reavalie seus convênios e acordos com hospitais conveniados com o Sistema Único de Saúde – SUS e que se negam a realizar procedimentos contraceptivos como a colocação do DIU e a pílula do dia seguinte, valendo-se de dogmas e doutrinas religiosas.
Basta de nos estuprar, criminalizar e silenciar! Basta de dogma
e doutrina religiosa no Estado.