O chavismo de direita
Não há muita dificuldade para se perceber semelhanças políticas e ideológicas entre o bolsonarismo e o chavismo. A truculência com os adversários é atitude comum entre os dois. Ambos adotam posturas em defesa do militarismo autoritário e o desprezo pelos valores democráticos. O Brasil contemporâneo tenta ser uma Venezuela com matiz de direita. O radicalismo é característica forte nos dois estilos de governo, cumprindo pauta ideológica agressiva e extremista. São coincidentes os comportamentos de anti-ciência, anti-imprensa e anti-democracia.
Interessante que numa entrevista concedida à Folha de São Paulo, em 1999, o agora presidente Bolsonaro rasgava elogios a Hugo Chavez. Chegou a dizer; “Gostaria que essa filosofia militarista chegasse ao Brasil. Acho ele ímpar”, e que o líder venezuelano era “uma esperança para a América Latina”. Os discursos também se parecem. Em 2009 quando detiveram a juíza Maria de Lourdes Afiuni, Chavez assim se pronunciou: “os que tomam um só centavo do tesouro público deveriam ser fuzilados e os juízes que não condenam esses casos também”. Já ouvimos algo parecido dito pelo nosso presidente. Porém essa atitude punitivista tão rigorosa vale apenas para os adversários. Quando observados esses pecados entre os correligionários não se verifica tal tipo de julgamento sumário.
O modelo Chavez de governar vem sendo copiado, ainda que um tanto estrambelhado. Afinal a formação intelectual do capitão não está no mesmo nível do caudilho venezuelano. Tanto é assim que, seguindo o exemplo do líder de nosso país vizinho, o atual governo brasileiro tem procurado atacar a liberdade de ensino, aparelhando o acesso à educação conforme atendimento ao pensamento ideológico que proclama. A retórica discursiva também se iguala quando atacam a corrupção, tentando passar a ideia da antipolítica. Nunca conseguem fazer autocrítica para admitirem que na prática contrariam o que dizem (considerando que Maduro sucede Chavez na mesma forma de pensar). Procuram colocar culpa de seus erros nos adversários. Chavez e Maduro atribuem aos Estados Unidos tudo o que de ruim aconteça na Venezuela. Bolsonaro, por outro lado, responsabiliza a esquerda global.
Suas biografias se equiparam. O presidente brasileiro costuma repetir a famosa frase do líder bolivariano: “o povo chegou ao poder”. Chavez mudou a composição do Tribunal Superior para exercer o controle de sua atuação, interferiu na estrutura do exército trazendo militares para ocupar cargos no governo. A falta de empatia faz com que não se sensibilizem com os dramas humanitários. Os dois cresceram politicamente desafiando a corporação militar a que pertenciam. Não escondem a vocação autocrática. O presidente brasileiro procura trilhar os caminhos da ditadura Venezuela, militarizando a política, tentando, inclusive, ampliar sua influência sobre as polícias estaduais e adotando uma política armamentista. Com isso impõe a simbologia do uso da força. As milícias virtuais são estimuladas a atacar a reputação dos opositores.
Se equivalem em muitas situações. Expressam o nacionalismo exacerbado. Exaltam e estimulam os conflitos. Rejeitam a diversidade. Têm obsessão por teorias conspiratórias. Desconfiam do mundo intelectual, impondo a cultura da ignorância por conveniência política. Por terem mentalidades conservadora e retrógada, recusam qualquer coisa que possa ser considerada como modernizante, inovadora, transformadora. Recusam curvar-se a qualquer instituição ou pessoa. Enxergam a cultura como instrumento de propaganda ideológica. Chegaram ao poder por eleições diretas, mas logo ao assumirem se dedicaram a minar a democracia.
A impunidade do general Pazuello que participou de um ato político em favor do presidente, afrontando as regras militares, nos remete à convicção de que, cada vez mais, estamos assistindo a venezualização do Brasil.
Rui Leitão