Voto de azar
Tem gente que recebe voto de pesar, depois de falecido. Outros conseguem voto de louvor, encômios gerais de louvamento chapa branca nas câmaras e assembleias. Eu recebi voto de desaprovação na Câmara de Itabaiana do Norte. Um amigo vereador apresentou meu livro “História de Itabaiana em versos” para ser objeto de voto de distinção, mas foi voto vencido. A oposição cismou que meu livro seria um compêndio de chaleirismo ao prefeito e detonou a homenagem. Para completar minha atribulação moral, recebo recado eletrônico do meu desafeto Maciel Caju, vazado nos seguintes termos hostis e malcriados:
“Desprezado Fábio Mozart, escrevo daqui para protestar contra tamanha maldade que fizeram com você aí na terra que não lhe viu nascer, mas onde sua cabecinha de retardado disparou as primeiras evacuadas mentais. Hoje, já velho e caquético, você leva uma desconsideração dessa, que é o voto de desaprovação do seu livrinho pela Câmara Municipal, desconsiderando seu estado mental de portador de alzeheimer, Parkinson, hemorroidas e unha encravada, sem falar no membro flácido e arroto azedo.
Clama aos céus tamanha injustiça dos vereadores, porque você merecia mesmo era voto de repúdio! Reza a lêndea que uma figura daninha como vossa mercê, no caso um tal de Bione, lá do Recife de becos e pontes, recebeu um voto de repúdio da Câmara local e até hoje arrota grandeza. Diz o tal Bione, editor de um pasquim chamado “Papa figo”, que não tem glória maior do que levar nas costas um voto de repúdio de vereador. É algo assim como ser considerado persona non grata pelo diabo e seus sete mil diabinhos. Em verdade, em verdade, vos digo: um cara velho de gréia igual a esse Mozart merecia esse momento de glória, esse voto de repúdio total e absoluto da vereança. Mas porém, muito pelo contrário, só botaram terra na titica do livro que ninguém leu, mesmo considerado o alto nível de analfabetismo. Se você está mais por baixo do que traseiro de cobra nas hostes vereançais, deve se dar por feliz.
Para um momento total de Glória Maria, o que eu desejo é que a Câmara dê seu nome para uma rua no baixo meretrício. Mas, nem tudo está acabado. Chegará o momento em que será reconhecida sua patente de escrevinhador sem futuro, com uma rua batizada com seu nome pelas autoridades incompetentes, no olho do cabaré. E depois, aprovação por unanimidade de voto de desfaçatez, com direito a discurso dos mais altos coturnos do nosso submundo político e social, fechando o firo com fala de Ameba, eterno candidato a vereador e a corno, entregando simbolicamente a chave da cidade ao homenageado e surrupiando a chave do cofre da prefeitura.
Para abrilhantar ainda mais a festança, aparece Madame Preciosa que não podia perder um evento de tamanha envergadura, que a cartomante só gosta de coisa grande. O prefeito aproveita a remandiola para inaugurar um fiteiro, um puteiro e dois batentes de casa suspeita. No seu discurso, o licurgo (que cabrunco é isso?) finaliza obrando: ‘é um grande prazer venéreo inaugurar essa via situada numa zona que tantas alegrias e blenorragias nos deu’. Com meu insincero voto de pesar pelo seu azar, Maciel Caju.”
Enfim, não guardo rancor desse elemento altamente banal. O dito cujo me classifica como um “zé ninguenzinho”. Maciel Caju chegou a me acusar de lítero-estelionatário. Não reagi. Ele faz parte do meu mundo simbólico. Não vou deletar o sacripanta. Mesmo porque, nesta minha idade, não é bom se desfazer de conhecidos, mesmo de qualidade inferior.