MÍDIA E SOCIEDADE

Uma gota em um oceano de sangue (tragédias em série)

Que o jornalismo vive uma crise de “identidade” grave, todo mundo ja percebeu há muito tempo, mas uma coisa não mudou nesse processo, o lucro e os interesses das empresas (familismo) prevalecendo sobre a imprensa. Perceba que o aprofundamento da informação (jornalismo), muita vezes, só é possível com a “anuência” dos patrões.

Observando a cobertura sobre o caso do agressor JOÃO PAULO CASADO, vi o jornalismo praticamente omitindo o nome do agressor. Depois apresentaram uma nota do advogado do agressor em que transforma a vítima em algoz, e aí o pior, espaços generosos no rádio, TV e sites pra mostrar o “arrependimento” do médico.

O que não foi aprofundado; a coisa mais importante, como pauta sequência, a ação do condomínio entregando as imagens, seguindo uma lei estadual (11.657). Outra lei, a Maria da Penha (11.340/06), também foi ignorada. Ela determina a continuidade de inquéritos sobre violência doméstica independente da vontade da vítima. Porque a PC arquivou a denúncia? Com base em quê, se a lei é clara.

O momento é grave, considerando a quadra recente de violencia, misoginia e preconceitos disseminados pelo bolsonazifascismo. Os retrocessos sao visíveis, os números, assustadores! Em 2022, 18,6 milhões de mulheres sofreram violência doméstica (50.962 por dia). Sobre os agressores, quase 60% dos casos são companheiros e ex companheiros (que lideram as agressões). Sobre as vítimas, mulheres negras (65,8% das agressões), mulheres brancas (29%).

O caso do médico agressor teve um bom momento, devo destacar, pra mostrar um ótimo exemplo com a repórter Ana Beatriz Rocha no JPB desta quarta, que fez as devidas abordagens e apontou as lacunas que precisam ser tratadas jornalisticamente. Deveria ter sido a primeira reportagem, não vir depois do pedido de perdão do agressor. Pareceu correr atrás do “time” perdido. Mas ainda sim, a melhor reportagem sobre o assunto.

E por fim, outro ponto curioso nas abordagens em geral. Como, no caso, se trata um médico, classe média, “gente de bem cristã”, o tratamento foi “vip”, protetivo. Quando se trata de um ignorante funcional e violento igual, mas pobre, aí o “espaço” são os programas policialescos com seu sensacionalismo barato pra audiência, com a boa e velha profundidade de um pires.

Não acredito em imparcialidade na mídia corporativa, mas acredito no jornalismo e seu compromisso com a qualidade da informação e a busca da verdade de interesse público através dos fatos do cotidiano. Nada é por acaso. Paulo Freire viu mais longe quando disse, “não existe imparcialidade, todos sao orientados por uma base ideológica. A questão é: sua base ideológica é inclusiva ou excludente?”

por Ulisses Barbosa

Redação DiárioPB

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