Relatório tem ‘equívocos conceituais’ e ‘desejo político’, diz Cardozo
O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou nesta segunda-feira (11) à comissão que analisa o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff que o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), favorável à continuidade do processo de afastamento, tem “contradições”, “equívocos conceituais” e “desejo político”. A comissão retomou na manhã desta segunda-feira o debate do parecer e pretende votá-lo até o fim do dia.
“Eu tenho absoluta convicção de que a leitura isenta e desapaixonada deste relatório é talvez a melhor peça de defesa que a presidente da República pode ter. As contradições, os equívocos conceituais e o desejo político de chegar ao impeachment ficam borbulhantes na leitura deste relatório”, afirmou Cardozo à comissão.
Cardozo, que já havia dito que o processo impeachment foi aberto por vingança, voltou a dizer que houve “desvio de poder” no caso. “Esse processos de impeachment nasce com um pecado original, com seu vício, que foi na utilização de sua excelência, presidente da Câmara, para fazer uma vingança”, afirmou.
O advogado-geral da União sustentou que a comissão do impeachment violou o direito de defesa em diversas ocasiões. Um dos exemplos citados foi o fato de a defesa da presidente Dilma Rousseff não ter sido notificada para se manifestar em algumas reuniões do colegiado. O advogado-geral da União comparou o andamento do processo de impeachment com o processo por quebra de decoro que investiga o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no Conselho de Ética.
“Na Comissão de Ética desta Casa o advogado do nobre presidente desta Câmara pede a palavra pela ordem. No processo de cassação, sabe qual o argumento que o presidente usou para anular decisões? Falta de intimação. Por que o que vale para lá não vale para cá? Por que o que vale para cassar o mandato de um parlamentar não vale para cassar o mandato de um presidente da República?”, questionou o AGU, o que gerou protestos no plenário.
Em sua fala, Cardozo afirmou ainda que os deputados só poderiam considerar, na análise do processo de impeachment, trecho da denúncia acolhida pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), quando da instauração do procedimento.
Ao acolher o pedido de Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, Cunha afirmou que só consideraria denúncias relacionadas a fatos ocorridos em 2015, no segundo mandato de Dilma. Para ele, a presidente não poderia ser punida por eventuais crimes cometidos no primeiro mandato. “Só o plenário pode admitir o processamento de uma denúncia que o presidente indeferiu. Aquilo que foi indeferido não pode ser discutido”, defendeu.
Bate-boca
Cardozo afirmou que não há provas de cometimento de crime e que, na dúvida, o relator defende o afastamento da presidente. Para ele, na dúvida, o processo deveria ser encerrado. E comparou o caso a um assassinato. “Eu não sei se alguém morreu. Não sei se tem delito, mas da dúvida, afaste-se”, disse.
A comparação gerou novos protestos em plenário. Deputados da oposição fizeram referência ao assassinato, em 2002, de Celso Daniel, prefeito de Santo André. “Morreu Celso Daniel”, gritaram. Enquanto isso, deputados governistas pediram que respeitassem o discurso de Cardozo.
“Sabem que é um golpe e não aguentam. Estou sendo agredidos por palavras desrespeitosas”, gritou Henrique Fontana (PT-RS). Houve um princípio de tumulto e bate-boca entre petistas e deputados do DEM e PSDB, que foi interrompido após apelo do presidente da comissão.
Decretos
Em seu pronunciamento, Cardozo mencionou os decretos de crédito extraordinário assinados pela presidente. Um dos principais pontos da denúncia diz respeito à liberação, por Dilma, de R$ 2,5 bilhões em 2015, sem aval do Legislativo.
Antes do advogado-geral da União discursar, Jovair Arantes afirmou que Dilma liberou os recursos quando já havia reconhecido as dificuldades no cumprimento da meta fiscal, mas antes de o Congresso aprovar o projeto de lei que permitiu o déficit de R$ 119 bilhões.
Cardozo afirmou que a meta fiscal não foi atingida porque caiu a receita prevista pelo governo. “Não foi um ato da presidente que gerou isso, foi uma situação circunstancial da economia”, afirmou.
“Por que há dolo, se o TCU aceitava isso durante anos? E não diga que não aceitava porque o TCU pediu ao Executivo decreto de suplementação, ele pediu para ele, então não aceitava? Onde está a ma fé se durante 15 anos de Lei de Responsabilidade fiscal, isso acontecia? Depois que o TCU mudou de opinião, ninguém mais baixou decreto nenhum”, disse o ministro.
Cardozo disse, ainda, que, quando a presidente editou os decretos, não havia uma discussão sobre esse assunto. “O relator diz que a má fé da presidenta vem do fato de que já era de amplo conhecimento o caráter proibitivo da conduta dos decretos no momento que ela os baixou. Vou provar que isso não é verdade”, disse.
O advogado-geral da União argumentou que, mais de um mês antes da edição de decretos, o TCU ainda não havia mencionado esses documentos. “O TCU aprovou as contas anteriores. Quem aprova contas e não faz ressalvas diz que aquilo era regular”, afirmou.
‘Golpe’
Cardozo encerrou o discurso reafirmando que o processo de Dilma não tem, segundo ele, base legal. Para o ministro, um eventual impeachment da petista “violaria” a “democracia” e o “Estado de Direito”.
“Eu defendo que essa violação jamais fará surgir um governo com legitimidade. A história não perdoa violência à democracia. Em que pesa a Constituição preveja o impeachment, esse relatório mostra que não há base legal e, por isso, esse processo de impeachment não deve ser chamado impeachment, deve ser chamado golpe, golpe de abril de 2016”, disse.
Após a conclusão da fala, deputados favoráveis ao afastamento de Dilma gritaram: “impeachment!, impeachment!”. Enquanto isso, governistas falaram: “Não vai ter golpe!”.
G1