Ramagem propôs a Bolsonaro retirar autonomia dos delegados para controlar investigações envolvendo o ex-mandatário, diz PF
Segundo a PF, Alexandre Ramagem sugeriu que todos os inquéritos que tramitassem no STF fossem supervisionados pelo diretor-geral da corporação
O relatório final da Polícia Federal (PF) sobre a tentativa de golpe de Estado no Brasil revela detalhes sobre o envolvimento de Alexandre Ramagem, ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e atualmente deputado federal, em uma tentativa de centralizar as investigações da PF. Segundo a PF, Ramagem sugeriu a Jair Bolsonaro (PL) a retirada da autonomia dos delegados federais, com o objetivo de controlar as apurações em andamento contra o então presidente desde 2020.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, em anotações encontradas com Ramagem, o agora deputado federal propôs que todos os inquéritos que tramitassem no Supremo Tribunal Federal (STF) fossem supervisionados pelo diretor-geral da PF.
“O contexto das anotações acima indica que Ramagem sugestiona ao então presidente Jair Bolsonaro que interfira junto à administração da Polícia Federal para restringir a atuação funcional de delegados da Polícia Federal junto a inquéritos que tramitam no Supremo Tribunal Federal”, aponta o relatório da PF. A proposta de Ramagem também visava contestar a escolha de delegados por ministros do STF, especialmente Alexandre de Moraes, a quem ele criticava por não questionar a nomeação de delegados para investigações.
A crítica de Ramagem se intensificou após o STF manter a delegada Denisse Ribeiro à frente de investigações como as das fake news e dos atos antidemocráticos, que, mais tarde, desaguaram nas apurações sobre o golpe. Ramagem chegou a afirmar em uma das anotações que “a PF nunca questionou a indicação de delegados por ministros do STF para investigações, da instauração arbitrária dos inquéritos e de como as diligências estão sendo executadas. A direção-geral e a corregedoria da PF precisam de mais coragem para apenas aplicarem a lei”.
A postura de Ramagem reflete uma tentativa clara de subordinar as investigações a uma estrutura mais centralizada, controlada pela sua pessoa e, por extensão, pelo presidente Bolsonaro.
Na época, os inquéritos relacionados a pessoas com foro privilegiado, que estavam sendo conduzidos pela PF, eram supervisionados pelo Serviço de Inquérito Especiais (Sinq), que dava autonomia aos delegados para conduzirem as apurações sem a necessidade de passar pelo crivo da direção-geral da PF. Essa autonomia, defendida por Ramagem, visava concentrar as investigações no cargo de diretor-geral, uma tentativa de replicar o modelo do Ministério Público, onde o procurador-geral da República preside todos os inquéritos que tramitam no STF.
A reportagem ressalta que embora a PF não tenha revelado a data exata da produção do documento, as anotações indicam que ele foi feito em 5 de maio de 2020 e revisado em 21 de março de 2023. As tentativas de Ramagem de centralizar o controle das investigações se intensificaram após a sua nomeação ser barrada por Alexandre de Moraes, que alegou que sua indicação visava uma intervenção na PF, dada sua proximidade com Bolsonaro. A demissão do ex-juiz suspeito e atual senador Sergio Moro, que foi ministro da Justiça do governo do ex-mandatário, também foi uma consequência direta dessa controvérsia.
A proposta de Ramagem de centralizar os inquéritos sob a direção-geral da PF voltou a ser discutida em 2021, sob o comando de Paulo Maiurino, que sucedeu Ramagem na direção da Polícia Federal. Maiurino apresentou ao STF a ideia de centralizar os inquéritos contra políticos nas mãos do diretor-geral, justificando que essa medida proporcionaria uma supervisão melhor das investigações e impediria decisões individuais desconectadas da posição institucional da PF.
Porém, essa proposta gerou reações internas de investigadores, que viram nela uma tentativa de controle das apurações e uma ameaça à autonomia da PF.
Com Brasil 247