CRÔNICAS DO COTIDIANO

“Quem cala, consente”

A sabedoria popular tem nos ensinado muito com o passar dos tempos. Os ditados populares, também chamados provérbios, transmitem experiências que nos orientam para o enfrentamento da vida cotidiana.  Por eles recebemos aconselhamentos e advertências transferidos de gerações para gerações. Por isso mesmo muitas verdades estão internalizadas nas nossas mentes. São manifestações da oralidade que nos oferecem conhecimentos obtidos na luta diária, cristalizados na nossa memória. Podem ser compreendidos metafórica ou literalmente, na conformidade do contexto vivenciado.

Colho na “cultura popular” um exemplo de ditado popular que tem um significado muito atual no momento político que estamos vivendo: “quem cala, consente”. Essa máxima popular nos induz a concluir que “quando alguém se cala diante de acusações que lhe são impostas, assume uma confissão silenciosa da culpa”.  Há um questionamento bíblico que diz: “porque calas, se és inocente”?  O silêncio utilizado como blindagem pode ter efeitos adversos inesperados. O problema que se procura evitar pode se agigantar mais na frente, alcançando, inclusive, pessoas de sua convivência.

Porque a preferência pelo silêncio, se a pessoa tem a oportunidade de apresentar sua defesa? Ou será exatamente esse o motivo para calar-se diante das indagações: falta de argumentos para provar sua inocência?  Essa postura vexatória não se compatibiliza com a imagem construída por alguém que ocupa cargos importantes na estrutura da administração pública. No mínimo, apresenta-se como conivente na produção dos fatos que o levaram a ser investigado. É também uma atitude que demonstra covardia.

Impossível discordar com o entendimento de que o silêncio é revestido de uma aura de dúvida. O deliberado vazio de comunicação faz com que a parte inquisidora faça o seu juízo de valor sem contestações. Então a dúvida funciona em desfavor de quem está sendo interrogado, autorizando interpretações à revelia por conta da ausência de suas manifestações. Silenciar é abrir mão da influência que poderia exercer na análise dos fatos investigados. Entendo que nesses casos o julgamento popular é instantâneo, sem muita chance de reversão.

Independente da técnica jurídica, ao leigo esse comportamento passa a impressão de indiferença, e até de deboche com as autoridades encarregadas da arguição. Daí o risco de um julgamento antecipado. Não acho que silenciar seja a estratégia mais acertada, ainda que sob a proteção de dispositivos legais. “O tiro pode sair pela culatra”, já que começamos o texto citando ditados populares.

Rui Leitão

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