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Quase 28 milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza no Brasil

Número de pobres atinge 27,7 milhões de brasileiros, após cair para 9,8 milhões e explodir para 34,3 milhões durante a crise sanitária.

Alavancado pelo desemprego, pela inflação, pela queda na renda e pela oscilação do valor do auxílio emergencial, o número de pessoas pobres no Brasil ainda se encontra em nível acima do registrado antes da eclosão da pandemia do coronavírus. A proporção de pobres, que em 2019 era 10,97%, ou 23,1 milhões de pessoas, chegou a 12,98%, ou 27,7 milhões de pessoas, em abril de 2021.

Os dados são da pesquisa Desigualdade de Impactos Trabalhistas na Pandemia, divulgada na última semana pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). A proporção de pobres é medida pela instituição considerando uma linha de pobreza de R$ 261 por pessoa a preços do primeiro trimestre de 2021. Esse valor corresponde a um salário mínimo mensal de renda de uma família de 4,6 pessoas.

No melhor ponto da série, em setembro de 2020, devido ao auxílio emergencial com valor mais alto, o número de pessoas abaixo da linha de pobreza caiu para 4,63%, ou 9,8 milhões de brasileiros. Já no primeiro trimestre de 2021, momento de suspensão do auxílio emergencial, atingiu 16,1% da população, ou 34,3 milhões de pobres.

Na visão dos pesquisadores, “os dados mostram um cenário desolador no início de 2021, quando em seis meses o número de pobres é multiplicado por 3,5 vezes, correspondendo a 25 milhões de novos pobres em relação aos seis meses anteriores”. Com o retorno do auxílio emergencial, embora em valores menores, e com duração limitada a partir de abril de 2021, o percentual chegou aos atuais 12,98%.

A intenção dos pesquisadores foi mostrar “uma visão ampla e atual da desigualdade de impactos trabalhistas da pandemia no Brasil”. Segundo eles, “poucos impactos são mais rápidos na chegada de uma crise e lentos na saída do que os ocorridos no mercado de trabalho, especialmente na base da distribuição de renda”.

A taxa de desemprego da metade mais pobre subiu de 26,55% em 2019 para 35,98% em 2021. Entre os 10 mais ricos, foi de 2,6% para 2,87%. Isto significa que o chamado “índice de desconforto”, composto pela soma simples das taxas de desemprego e de inflação, não só subiu como subiu muito mais entre os mais pobres.

Ao mesmo tempo, a renda individual média, entre informais, desempregados e inativos, está 9,4% abaixo do nível registrado no final de 2019. Na metade mais pobre da população, a perda é maior que o dobro, chegando a -21,5%. Com isso, a renda per capita habitual do trabalho, que já tinha caído 14,1% do ápice de R$ 255, no quarto trimestre de 2014, para R$ 219 no quarto trimestre de 2019, chegou a R$ 172 no segundo trimestre de 2021.

Já a queda de renda entre os 10% mais ricos foi de -7,16%, menos de 1/3 da queda observada na metade mais pobre. O grupo do meio, entre os 50% menos e os 10% mais ricos, teve queda de renda de 8,96%.

Desemprego e inflação descontrolados geram estagflação

Coordenador do estudo, o professor da FGV Social Marcelo Neri afirmou que o aumento do desemprego foi a causa de pouco mais da metade (-11,5%) da queda de renda dos mais pobres. O “efeito desalento” ocasionou a queda de renda 8,2 pontos percentuais na metade mais pobre, enquanto na média geral a perda ficou em 4,7 pontos, “sendo a segunda causa mais importante para a deterioração do binômio média e desigualdade trabalhista”, prosseguem os pesquisadores.

“Nesse forte aumento de desigualdade, o principal elemento é a ocupação, em particular o aumento do desemprego. É o que explica metade dessa queda de renda dos pobres. Além disso, muita gente saiu do mercado de trabalho porque não pôde exercer uma ocupação ainda por causa da pandemia”, explicou Neri à Agência Brasil.

“O cenário de turbulência política, choques climáticos e possível racionamento de energia pode gerar uma tempestade perfeita”, estima Neri, que chama a atenção ainda para a estagflação. A combinação de inflação alta e desemprego elevado é mais um fator de impacto nos mais pobres, em um momento de choques de oferta e possibilidade de racionamento e crises de abastecimento.

Nos últimos 12 meses terminados em julho de 2021, a inflação dos pobres foi 10,05%, quase 3 pontos acima da inflação da alta renda (7,11%). Ele se deu em função do maior aumento do preço de alimentos e do gás de cozinha, entre outros elementos que tem maior peso na cesta de consumo dos mais pobres.

O diretor da FGV Social chamou atenção para a queda de renda ser maior que a do PIB e para o aumento da desigualdade. “Os mais pobres sofreram mais e quando a gente abre o efeito que caracteriza o atual quadro de estagflação, ela também é mais séria entre os mais pobres. Aí por uma série de coisas, como o movimento dos caminhoneiros, o racionamento de energia, são o que a gente chama de choque de oferta e eles são muito ruins porque piora tudo, piora a inflação e o desemprego também”, completou.

O índice de Gini, que mede a desigualdade e já havia aumentado de 0,6003 para 0,6279 entre os quartos trimestres de 2014 e 2019, saltou na pandemia. O indicador atingiu 0,640 no segundo trimestre de 2021, ficando acima de toda a série histórica pré-pandemia.

Três milhões estão na fila por benefícios sociais e previdenciários

Atualmente, 3 milhões de brasileiros estão à espera de benefícios sociais e previdenciários numa fila que o desgoverno Bolsonaro não reduz. São 1,2 milhão de pessoas esperando o Bolsa Família e 1,8 milhão aguardando aposentadoria ou pensão do INSS. Destas, 600 mil são pessoas com deficiência ou idosos pobres em busca do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Em agosto, o Bolsa Família foi pago a 14,6 milhões de famílias. Conforme dados do Ministério da Cidadania, havia outras 1.186.755 pessoas que atendem aos critérios do programa no Cadastro Único, mas não foram incluídas por falta de recursos. A proposta de Orçamento para 2022 prevê R$ 34,7 bilhões para 14,7 milhões de famílias, o que não abre espaço para zerar a fila nem para aumentar o valor do benefício.

O pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia, (FGV/Ibre), que analisou o aumento da pobreza em 23 estados e no Distrito Federal entre janeiro de 2019 e o primeiro mês deste ano, destaca a inação do desgoverno Bolsonaro para lidar com o fenômeno. “Uma das propostas do governo era atrasar o pagamento de precatórios para abrir espaço para um programa que pague mais que o Bolsa Família. Mas isso é sustentável? Esse é meu medo”, questionou na Folha de São Paulo.

“Se a sustentabilidade do novo programa for condicionada a esse tipo de saída, vai ter dinheiro em 2022 e não se sabe se vai ter mais lá na frente”, lembrou Tereza Campello, ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome durante todo o Governo Dilma. “A transferência de renda não pode se dar de forma incerta. As famílias precisam saber que podem contar com aquele recurso, ou vão acabar vivendo em mais incertezas.”

Para os senadores do PT, Bolsonaro perdeu o controle da economia do país. “A propagação de mentiras e ataques às instituições democráticas não é à toa. Serve para mascarar os verdadeiros problemas deste país: inflação nas alturas, povo passando fome e economia em ruínas”, afirmou o líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA). “Tirar Bolsonaro do poder é a única forma de resgatar o Brasil deste buraco sem fundo.”

Da Redação, com PT no Senado e agências

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