O auxílio emergencial teve efeito imediato na redução da miséria no Brasil. Entre maio e junho de 2020, a população em pobreza extrema (com renda inferior a US$ 1,90 por dia, equivalente a R$ 154 mensais) caiu de 4,2% para 3,3%. Já o percentual de brasileiros em situação de pobreza (com renda menor de US$ 5,50 por dia, ou R$ 446 mensais) também diminuiu de 23,8% para 21,7%.
É o que aponta um estudo do pesquisador Daniel Duque, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). Conforme o levantamento, o principal responsável pelo encolhimento da pobreza no período foi o auxílio emergencial – que ampliou o atendimento de 45% para 50% da população de baixa renda.
Como resultado, os níveis de penúria são os menores já registrados por todas pesquisas domiciliares brasileiras. Nos anos 1980, quase 15% dos brasileiros sofriam com a pobreza extrema. Ou seja, o socorro aos mais pobres – uma conquista do PCdoB e da oposição ao governo Bolsonaro – criou uma situação nunca vista nos últimos 40 anos.
Segundo o pesquisador, o estudo não é apenas um reconhecimento da importância do auxílio emergencial durante a pandemia do novo coranavírus. Seus dados indicam também uma preocupação real com o que vai acontecer com parcela significativa da população brasileira quando acabar o estado de calamidade, em 31 de dezembro.
“O auxílio mostrou que as políticas sociais no Brasil são mal desenhadas. A retirada desses R$ 600 mensais tende a levar a extrema pobreza aos níveis de 2007”, ressalta Daniel Duque. Os 3,3% da população, hoje, representam 6,9 milhões de pessoas. Em 2007, 9,2% da população (17,5 milhões) viviam na extrema pobreza.
“A população do país aumentou. Esse percentual (9,2%), atualmente, significa 19,3 milhões de cidadãos”, diz Duque. Ou seja, no início de 2021, a tendência é a população miserável mais que triplicar se nada for feito. “Quando se olha para os níveis de renda, se constata que o aumento das desigualdades explodiu. Os mais ricos elevaram a renda durante a pandemia, e os mais pobres viram o dinheiro minguar no bolso”, reforçou.
Invisíveis
Para o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, se houve algo de “positivo na pandemia” de Covid-19, foi justamente “a descoberta dessas pessoas invisíveis e informais – alguns sem certidão de nascimento ou CPFs”. O dilema do governo será retirar o auxílio emergencial, de caráter temporário, sem traumas e sem ferir as expectativas de ganho. “Certamente, os níveis de pobreza vão aumentar depois”, admite.
Na análise do economista, Bolsonaro – invariavelmente vulnerável à agenda ultraliberal do ministro Paulo Guedes (Economia) – está em uma encruzilhada. Segundo ele, o governo “precisará incorporar ao Renda Brasil parte do auxílio emergencial, para evitar que volte a aumentar a faixa da extrema pobreza”.