JUSTIÇA

PEC das Drogas: CCJ contraria ciência e aprova criminalização de qualquer usuário

A proposta não é apenas um retrocesso em relação a própria (e defasada) lei de drogas brasileira, mas vai na contramão de tudo o que é considerado razoável em nível global

Em praticamente todos os países considerados democráticos o debate sobre drogas gira em torno da saúde pública, do bem-estar dos usuários e da criação de novos mercados com a legalização de substâncias como a maconha. A questão policial fica por conta apenas do combate aos grandes cartéis que, para além da venda de drogas, praticam outros crimes violentos. Mas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da nossa Câmara dos Deputados o que é razoável para o resto da humanidade simplesmente não serve, e a ânsia dos parlamentares é a de lotar as prisões brasileiras com usuários de drogas.

A aposta parece ser a de que, de repente, as penitenciárias fiquem insustentáveis e a privatização ressurja no debate como uma salvação mágica.

Essa é a única explicação possível para a aprovação da PEC das Drogas pela CCJ nesta quarta-feira (12). O projeto, apresentado pelo presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), constitucionaliza a criminalização do porte e posse de qualquer quantidade de quaisquer drogas consideradas ilícitas.Foram 47 votos favoráveis ao projeto contra 17. Federações Psol-Rede e PT-PV-PCdoB orientaram seus parlamentares a votarem contrários. O governo, no entanto, não fez qualquer orientação. A ala mais tecnocrata e conservadora defende o abandono das chamadas “pautas de costumes” em detrimento da pauta econômica, uma vez que o Congresso seria “muito conservador”. A ala de esquerda, que observa as consequências mais amplas da aplicação da norma, tentou adiar a votação. Conseguiu na última semana, mas não repetiu a dose dessa vez e a boiada passou.

O texto não é um retrocesso apenas aos “parlamentares de esquerda”, como escreveu a Folha, em clara tentativa de despolitizar o debate ao fazer uma análise política completamente fraudulenta. Trata-se de retrocesso em relação a todo debate minimamente razoável travado ao redor do planeta e à própria lei de drogas brasileira que, mesmo com seus defeitos e contraindicações elitistas, pelo menos se presta a diferenciar usuários de traficantes.

“Nós não vamos resolver o que se imagina e, por outro lado, vamos criar uma ilusão e penalizar aqueles que muitas vezes precisam do apoio da sociedade. O que precisa ser tratado com rigor é o tráfico de drogas, quem usa o sistema das drogas para ganhar dinheiro e se beneficiar”, declarou o deputado Helder Salomão (PT-ES).

Chico Alencar (Psol-RJ), por sua vez, apontou a inconstitucionalidade da proposta. “Se aprovada vai agravar a situação daqueles que exigem cuidados de saúde pública, proteção social e não punição”, afirmou.

“Essa PEC não ajuda em nada a produção de uma sociedade mais saudável, menos conflituosa e não diminuirá em nada essa realidade terrível do tráfico armado. Considero que um menino portando uma trouxinha de maconha é menos letal do que ele próprio com uma AR-15 no braço”, completou.

Próximos passos

Agora o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), deve delegar a análise da proposta a uma comissão especial que terá até 40 sessões para votar o texto. Se aprovada na comissão especial, a PEC irá a plenário, onde precisará de 308 votos, de 513 deputados, para ser aprovada em dois turnos. Se passar também no Senado, será promulgada pelo próprio Congresso. PECs não precisam de sanção presidencial.

Com Brasil 247

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