Pandora Papers: Empresas de Paulo Guedes e Roberto Campos Neto aparecem em investigação de paraísos fiscais
Projeto teve acesso a 11,9 milhões de documentos sobre companhias sediadas em paraísos fiscais
O ministro da Economia, Paulo Guedes, mantém uma empresa offshore em um paraíso fiscal com US$ 9,55 milhões.
É o que mostra um projeto do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), que teve acesso a 11,9 milhões de documentos sobre companhias sediadas em paraísos fiscais. No Brasil, a investigação batizada como “Pandora Papers” foi feita pela revista piauí, pela Agência Pública e pelos sites Poder360 e Metrópoles.
Segundo esses veículos, Guedes criou uma offshore chamada Dreadnoughts International em setembro de 2014, nas Ilhas Virgens Britânicas, um conhecido paraíso fiscal do Caribe, e ao longo dos meses seguintes depositou um total de US$ 9,55 milhões na conta da empresa.
Embora manter offshores não seja ilegal – desde que os valores sejam devidamente declarados à Receita Federal -, um artigo do Código de Conduta da Alta Administração Pública proíbe autoridades públicas de investirem em bens “cujo valor ou cotação possa ser afetado por decisão ou política governamental” a respeito da qual o funcionário tenha “informações privilegiadas, em razão do cargo ou função”. Isso inclui “investimentos de renda variável ou em commodities, contratos futuros e moedas para fim especulativo”.
Segundo a piauí, Guedes, que comanda o Ministério da Economia desde janeiro de 2019, informou a Comissão de Ética Pública (CEP) sobre seus investimentos no exterior logo no início de sua gestão.
A CEP, no entanto, não encontrou nenhuma irregularidade nem fez qualquer recomendação para o ministro entregar a gestão desse patrimônio a terceiros.
Em seu perfil no Twitter, o líder da oposição na Câmara dos Deputados, Alessandro Molon (PSB-RJ), anunciou que vai pedir uma investigação ao Ministério Público e a convocação de Guedes para dar explicações no Congresso. “É escandaloso – e ilegal – que funcionários públicos de alto escalão, com acesso a informações privilegiadas, mantenham esse tipo de aplicação. Investigação já!”, cobrou o deputado.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, também tinha uma offshore, mas no Panamá, com capital de US$ 1,09 milhão. Chefe do BC desde fevereiro de 2019, Campos Neto fechou a offshore apenas no segundo semestre de 2020.
Além disso, manteve entre 2007 e 2016 uma empresa nas Ilhas Virgens Britânicas.
Conflito de interesses
Entre os exemplos de conflitos de interesses citados pela piauí está a proposta de reforma tributária em tramitação no Congresso Federal.
Inicialmente, o projeto previa a taxação de ganhos de capital no exterior, mas essa medida acabou derrubada. Além disso, a proposta do governo prevê a redução da tributação sobre a repatriação de recursos, que hoje varia de 15% a 27,5%, para 6%.
Quando Guedes assumiu o Ministério da Economia, em janeiro de 2019, os US$ 9,55 milhões depositados nas Ilhas Virgens Britânicas valiam quase R$ 37 milhões. Hoje equivalem a R$ 51,5 milhões, uma diferença de R$ 14,5 milhões, ou de R$ 9 milhões, se descontada a inflação pelo IPCA no período.
Por meio de nota enviada à piauí, o Ministério da Economia disse que “toda a atuação privada” de Guedes antes de sua posse “foi devidamente declarada à Receita Federal e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada”.
“Sua atuação sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade. Desde que assumiu o cargo de ministro da Economia, Paulo Guedes se desvinculou de toda sua atuação no mercado privado, nos termos exigidos pela Comissão de Ética Pública, respeitando integralmente a legislação aplicada aos servidores públicos e ocupantes de cargos em comissão”, diz a nota.
Já Campos Neto argumentou que as duas offshores atribuídas a ele “estão declaradas à Receita Federal e foram constituídas há mais de 14 anos com rendimentos obtidos ao longo de 22 anos de trabalho no mercado financeiro, decorrentes, inclusive, de atuação em funções executivas no exterior”.