Mudança de governo põe em risco política pública para tratamento da Doença Falciforme
Depois de mais de 10 anos de expansão de políticas públicas em saúde pública destinadas ao tratamento da doença falciforme, a mudança de governo na esfera federal pode ocasionar uma interrupção abrupta no programa nacional de atenção integral às pessoas com esse tipo de hemoglobinopatia, mantido pelo Ministério da Saúde. Estima-se que no Brasil, mais de 200 mil pessoas com esse tipo de patologia, genética e hereditária, dependam do SUS.
A coordenação do programa, que se encontrava dentro do organograma da Coordenação-Geral de Sangue e Hemoderivados, do Departamento Departamento de Atenção Hospitalar e Urgência (DAHU) deve passar a ser subordinada à Coordenação-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas, vinculada à Secretaria de Atenção à Saúde (SAS).
Também é quase dada como certa a substituição da atual coordenadora do programa, Maria Cândida Queiroz, que deverá ser devolvida à Secretaria de Saúde de Salvador, onde é originalmente lotada. Ainda não se sabe por quem ela será substituída, ou se a função será simplesmente extinta.
Controle social
Uma outra mudança em curso deverá ser a exclusão das representações dos usuários em vários espaços decisórios sobre a política pública da área. Já é praticamente consenso, dentro da equipe de gestão do MS do Governo Temer, por exemplo, que o Ministério não irá mais financiar a participação dos representantes dos pacientes no principal evento técnico sobre doença falciforme, um simpósio que ocorre a cada dois anos no Brasil e reúne as principais autoridades e pesquisadores (inclusive internacionais). Ano que vem o evento está programado para acontecer em Belo Horizonte (MG), mas apenas com a presença de médicos, outros profissionais da saúde e gestores públicos.
“Tradicionalmente o simpósio agregava as representações dos usuários e pacientes, entendendo que a participação desse segmento enriquece as discussões meramente técnicas e fomenta a interação entres aqueles que pesquisam a doença e os beneficiários das inovações tecnológicas. Além disso, as associações de pacientes utilizavam o simpósio para realizar encontros desse segmento, aprimorando o controle social”, comenta Dalmo Oliveira, coordenador de comunicação da Federação Nacional de Associações de Pessoas com Doenças Falciformes (FENAFAL).
Segundo Oliveira, a PEC 241 e as mudanças de diretrizes na gestão do MS deverão provocar uma estagnação, dentro do SUS, de tudo que os usuários com doença falciforme obtiveram nos últimos anos. “Nosso desafio agora vai ser manter os direitos e conquistas obtidos, porque avanços, temos certeza, não acontecerão nos próximos três anos, pelo menos.
“Sem investimentos no setor, a garantia do transplante de medula óssea para um maior número de usuários será fortemente comprometida. Prevemos ainda limitações da oferta de leitos e de medicamentos de alto custo”, diz. O ativista lembra que a doença falciforme no Brasil atinge principalmente a população negra, mais pobre e com menos acesso às informações. “Trata-se de uma patologia cuja problemática ultrapassa os limites da medicina, das questões hospitalares e do sistema de saúde, e tem implicações sociais muito fortes”, comenta Dalmo.
DIÁRIOPB