Morre Marcelo Yuka aos 53 anos, fundador do grupo O Rappa

Marcelo Yuka
Marcelo Yuka – Reprodução / Facebook

Morreu, aos 53 anos, no fim da noite desta sexta-feira, o fundador e ex-integrante do grupo O Rappa, Marcelo Yuka. O músico estava internado desde o fim do ano no Hospital Quinta D’Or, em São Cristóvão, na Zona Norte do Rio, para tratar de uma infecção. De acordo com a assessoria do hospital, Yuka morreu às 23h40, por causa de um Acidente Vascular Cerebral Isquêmico.

Nas últimas semanas, Yuka já tinha sofrido um AVC e seu quadro de saúde piorou. Foi então, que ele foi deslocado para o CTI da unidade, permanecendo em estado gravíssimo, até então.

O músico ficou paraplégico em novembro de 2000 após ser baleado em um assalto, na Tijuca. Desde então, seu estado de saúde foi tendo complicações.

A última postagem do músico, em outubro do ano passado – Arquivo Pessoal

Valeu a pena!

Marcelo Yuka venceu muitas batalhas; mas não todas! Desde que foi baleado, o letrista das mais icônicas canções do Rappa e da música brasileira do final dos anos 90 lutou contra uma condenação súbita e irreversível: a cadeira de rodas.

Contudo, reduzir Marcelo Yuka a um músico paraplégico seria um atentado ainda maior do que aquele sofrido no dia 9 de novembro de 2000, quando o músico dirigia uma picape Hilux e passava pela Rua José Higino, na Tijuca, onde um grupo de bandidos tentava assaltar uma mulher. O lugar errado, na hora errada. Foram disparados 22 tiros contra o seu carro, dentro os quais nove o acertaram. “Eu me via explodindo”, contou, anos depois.

Ao contrário do que se supõe como resposta imediata aos primeiros versos de “Me Deixa”, um dos sucessos do grupo, nem mesmo os tiros que acertaram a parte inferior de sua coluna foram capazes de deixá-lo em casa para sonhar. O que não significa, é claro, que tenha sido fácil.

Marcelo Yuka – Arquivo Pessoal

No auge de sua carreira musical, o novo enredo da vida do garoto criado em Campo Grande e Angra dos Reis era promissor. O disco “Lado A, Lado B”, divisor de águas na história da banda e quase inteiramente composto por ele, já havia vendido aproximadamente 500 mil cópias, e o videoclipe da música “Minha Alma”, de composição sua, acabara de ser consagrado o maior vencedor da história do Prêmio Video Music Brasil (VMB), da MTV, levando seis estatuetas para casa. Além disso, também faturou o Prêmio Multishow de melhor clipe do ano.

“Meu momento de maior alegria no Rappa foi quando o clipe de ‘Minha Alma’ ganhou vários prêmios na MTV”, afirmou Yuka, em sua autobiografia, intitulada “Não se Preocupe Comigo”.

Mas o episódio também revelou desavenças que se arrastavam desde os primeiros anos da banda, e que apenas pioraram após a cadeira de rodas. “Marcelo Falcão (vocalista do grupo) é um grande ator: talentoso não só na arte de cantar como também na de iludir”, disse, antes de revelar uma discussão com o vocalista da banda durante a gravação do premiado clipe de “Minha Alma”: Falcão queria inserir mais imagens da banda, já Yuka queria mostrar “menos a banda e mais as ideias”.

O embate com o vocalista se dava, em primeiro plano, pelo choque entre a concepção “mercadológica” de Marcelo Falcão e a preocupação de Yuka pelo “conceito”. Mas, em linhas gerais, poderia ser compreendido pela dificuldade de convivência entre o letrista e o ego do frontman. “Até hoje, (o Falcão) não entende o que está cantando. Aliás, na grande maioria das músicas, ele nem sabe o que tem ali”, o baterista afirmou, em uma ocasião.

Marcelo Yuka – Arquivo Pessoal

Após ser alvejado, Yuka não teve o mesmo suporte da banda do que, por exemplo, Herbert Vianna teve após sofrer o acidente que também o deixou em uma cadeira de rodas. “Até neurologicamente isso foi importante para a recuperação do Herbert ser humano, não necessariamente do músico. Isso me foi tirado”, constatou Yuka, sem esconder a mágoa sentida ao ser afastado da banda, no auge de seu sucesso como músico e letrista, após o ocorrido no final de 2000.

Marcelo Yuka admite que nunca esteve por muito tempo na mesma banda, e que isso talvez seja culpa sua. O ressentimento que sobrou da relação com Falcão, contudo, está longe de ser a tônica de suas relações. Ao longo de sua trajetória – como músico e como ser humano – Yuka colecionou amigos e parcerias musicais.

O m – Arquivo Pessoal

O Rio de Janeiro dos anos 90 efervescia musicalmente, especialmente na Baixada Fluminense e na Lapa, lugares onde Yuka transitava com desenvoltura e onde inevitavelmente os músicos da chamada “Hemp Family” viriam a se encontrar. Em sua autobiografia, ele conta que, após ser apresentado a Marcelo D2 e BNegão, se sentiu “novamente integrando uma cena”. “Não ia mais sozinho assistir aos shows, agora ia com a galera. Antes de entrar, a gente ficava bebendo cachaça do lado de fora”.

Yuka era bateirista do KMD-5, sua primeira banda e uma das responsáveis pelo começo da cena de reggae da Baixada, juntamente com o grupo Cidade Negra. Lauro Farias, o baixista da KMD-5, fundou com ele, Falcão, Marcelo Lobato e Xandão a banda O Rappa. O resto é história.

O engajamento e a consciência social de Marcelo Yuka sempre estiveram presentes em suas canções e, após sua saída do Rappa, apenas se intensificaram. Em 2004, Yuka fundou o grupo F.U.R.T.O (Frente Urbana de Trabalhos Organizados), cujo carro-chefe foi a música homônima à sua biografia: “Não se preocupe comigo”.

Além da banda, o músico também fundou a B.O.C.A (Brigada Organizada de Cultura Ativista) – uma ONG para levar atividades culturais para entidades carcerárias – e participou, junto ao Afroreggae, da criação da Fase (Federação de Órgãos para Assistência e Educação do Rio de Janeiro).

Yuka na época em que foi vice na chapa de Freixo à Prefeitura do Rio – Arquivo Pessoal

Mas foi apenas em 2012 que Yuka se envolveu diretamente com a política – a política institucional, partidária, fora das ruas ou das letras de suas músicas. Assim que recebeu o convite de Marcelo Freixo para ser vice na chapa do Psol à Prefeitura do Rio, o músico conta que se sentiu honrado, mas tratou com desdém: “Vocês estão malucos!”.

Após ouvir melhor o programa de Freixo, acabou topando. “Cheguei ao final da campanha mais otimista do que quando entrei, especialmente ao me deparar com uma juventude com esperança política, que não está só advogando em causa própria”, concluiu.

Marcelo Yuka – Reprodução / Facebook

Em 2017, Yuka lançou o álbum “Canções para Depois do Ódio”, seu primeiro trabalho após mais de uma década, contando com as participações de Black Alien, Céu, Seu Jorge e outros músicos e amigos.

Marcelo Fontes do Nascimento Viana de Santa’Ana, ou simplesmente Marcelo Yuka, deixa como legado uma trajetória de música, poesia, consciência, superação e amor. Assim como o Yuka não precisou do movimento de suas pernas para seguir em frente, suas canções e memórias certamente atravessarão gerações e continuarão inspirando e tocando corações de quem parar para escutá-las.

Valeu a pena, Yuka!

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