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Meu corpo, minha luta: a tatuagem usada como militância política

Tatuagens de protesto incluem imagem clássica de Lula e Sérgio Moro como um Pinóquio moderno

Tatuagens de Lula e Marielle feitas pelo tatuador Ruy Pinheiro

Carta Capital – Dia 7 de abril de 2018. O dia que o Brasil parou para acompanhar, pela primeira vez na história, um pedido de prisão feito contra um ex-presidente. Luiz Inácio Lula da Silva foi julgado pelo crime de lavagem de dinheiro, no caso do tríplex do Guarujá, e foi condenado a 12 anos de confinamento.

Lula foi preso na Superintendência da Polícia Federal de Curitiba dois dias depois da confirmação da pena pelo TRF-4 de Porto Alegre. A partir do momento em que o petista entrou no local, onde ficaria por 580 dias, seus militantes começaram um movimento por sua soltura. “Lula Livre” foi o grito de resistência durante os quase dois anos em que o ex-presidente esteve preso.

Mas não só no grito ficaram as manifestações. É o caso do empresário de Santa Catarina, Marcos Vinicius Zanella. O militante de 29 anos resolveu homenagear seu ídolo político de uma maneira inusitada: tatuando o rosto de Lula em sua perna.

 

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O empresário não pensou duas vezes quando Lula foi preso. Foi até um estúdio de tatuagem de sua cidade e, na semana seguinte  em que ex-presidente tinha sido encarcerado, o rosto do petista estava estampado na pele de Marcos para o resto da vida.

“Sou fã do Lula desde pequeno. Em 1998, com apenas oito anos, eu colocava barba no meu rosto para ficar igual a ele. Acho que por tudo que ele fez pelos mais necessitados, valeu a homenagem, inclusive já escrevi pra ele e mandei fotos da minha tatuagem”, disse o empresário que ainda não obteve uma resposta do ex-presidente.

Tatuagem de Marcos Vinicius Zanella, que retrata o rosto do ex-presidente Lula

O catarinense conta que já sofreu discriminação por sua tatuagem, mas não se arrepende da homenagem. “Sofro algumas discriminações andando de calção em alguns lugares, e também motivo de deboches provocativos, mas não me abala”‘, conta.

A polarização dentro dos estúdios

A ideia de fazer tatuagem com cunho político tem ganhado força em tempos de polarização. É o que ocorreu no estúdio Cartel 021, na cidade de Cachoeiras de Macacu, no Rio de Janeiro. O tatuador Marcos Taylor Navega, de 27 anos, conta que na época das eleições de 2018 houve duas procuras inusitadas: um rapaz quis tatuar ” Ninguém solta a mão de ninguém”, frase que foi utilizada para fazer oposição a Jair Bolsonaro, e um outro homem resolveu marcar em sua pele o tema da campanha do ex-capitão: “Deus acima de tudo” acompanhado por uma mão fazendo sinal de arma.

Navega conta que, em ambos os casos, houve uma justificativa do motivo pelo qual os rapazes haviam escolhido aqueles desenhos e o tatuador não toma partido. “O que faço é sempre explicar para meus clientes que essa é uma decisão definitiva, então é bom ter certeza de que essa opinião política não irá mudar ao longo da vida”, conta.

Desde 2018, Navega conta que houve um aumento na procura de tatuagens com cunho político em seu estúdio. Depois que tatuou a frase “Ninguém solta a mão de ninguém”, o fluminense começou a encontrar desenhos semelhantes nas ruas e nas redes sociais.

As tatuagens mais procuradas no estúdio de Navega são desenhos e frases que remetem à luta feminista. Foi o que pediu a paulistana Camila Victor. A jornalista, de 41 anos, fez no começo deste ano uma tatuagem em seus braços retratando o símbolo do movimento feministas. Camila tatuou também o rosto de Frida Kahlo, a artista mexicana que virou símbolo de luta das mulheres, e a frase “Meu corpo, minhas regras”, jargão utilizado pelo movimento.

“Sou feminista desde que me conheço por gente e senti necessidade de colocar isso na pele, em um lugar que todo mundo pudesse ver. É como se fosse um cartaz para mim”, conta Camila.

A Frida é minha grande referência na vida, por sua história e a liberdade com que ela viveu. ‘Meu corpo, minhas regras’ é como um mantra. Fiz depois que fui agredida pelo pai da minha filha, após uma discussão que me levou ao divórcio. Nosso corpo, especialmente das mulheres, tem que ser respeitado e, em uma sociedade como a nossa, em que o machismo se confunde com o ar que respiramos, senti a necessidade de marcar a minha pele com o aviso”, conta a jornalista.

Camila já tem marcada sua próxima tatuagem, uma mensagem de empoderamento: “Vaca profana”.  A ideia surgiu da música de Caetano Veloso. “Minhas tatuagens funcionam como lembranças do que vivi, do que quero viver e do que não aceito do outro. Avisos de perigo, não chegue perto”, conclui Camila.

Tatuages de Camila Victor

Bolsonaro aqui não

A polarização não acontece no Mix Tatoo, em Olinda. E por um motivo bem específico. O tatuador Vanberto Rolfino de Santana Junior, conhecido como Alado Rolfino, de 34 anos, vem realizando alguns trabalhos de protesto contra Bolsonaro e integrantes do seu governo.

O presidente da República com um ânus no lugar da boca, Sérgio Moro em forma de Pinóquio e Mourão com o símbolo nazista no rosto foram trabalhos produzidos por Rolfino. Ele adiantou que um desenho sobre o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, está sendo produzido.

Tatuagens feitas por @aladorufino

“Utilizo a minha arte como protesto. Coloco minha ideologia em meus desenhos”, conta o tatuador. E deixa claro: jamais faria qualquer tatuagem em homenagem a Bolsonaro.

“Jamais desenharia, de jeito nenhum. Eu não iria me sentir bem. Eu sou do nordeste. Ele complicou bastante a vida aqui. Ele é muito preconceituoso, entre outras coisas ruins”, conta Rolfino.

Tatuagem como crítica social

Tatuador da cidade de Natal, Ruy Pinheiro conta que a procura por esse tipo de arte veio aumentando em seu estúdio nos últimos meses. Desenhos com o rosto de Lula, Marielle Franco e líderes indígenas foram alguns exemplos tatuados por ele.

Inspirado também no momento político, ele criou diversas artes autorais para concorrer em eventos e convenções, nacionais e internacionais, falando sobre as questões sociais do Brasil.

“A arte serve exatamente para isso: nos tirar do lugar comum. Como a minha especialidade é realismo, seja colorido ou preto e branco, quando vou competir com outros tatuadores procuro representar minha arte, na categoria cultura brasileira, fazendo um raio-X da realidade do nosso país, nem sempre é fácil ganhar o troféu criando esse tipo de peça, mas a repercussão é sempre muito positiva”, explicou Ruy, que tem 11 anos de profissão.

Desenho de líder indígena feita por @ruypinheirotattoo

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