Índios tabajara pretendem retomar agricultura
Alguns hectares de terra para plantar macaxeira, inhame, fruteiras e criar galinhas, patos e cabras. Esse agora é o atual desafio para cerca de 15 núcleos familiares de índios da, quase extinta, etnia tabajara, que iniciaram um processo de retorno às áreas rurais nas proximidades da região metropolitana da capital paraibana, João Pessoa. A reivindicação foi apresentada ontem pelo Cacique Ednaldo e outros representantes indígenas num evento ocorrido na Baía da Traição, promovido pelo Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional da Paraíba (CONSEA-PB).
A conferência temática reuniu mais de 100 pessoas, a maioria oriunda das aldeias potiguara espalhadas pelos municípios de Marcação, Rio Tinto, Mamanguape e Baía da Traição. Cerca de 20 indígenas tabajara, que vivem em bairros de João Pessoa e no litoral sul, foram ao evento em um ônibus fretado pelo Governo da Paraíba.
Um ponto em comum na fala das lideranças dos dois grupos étnicos foi o posicionamento firme contra a proposta da PEC 215, em tramitação no Congresso Nacional, que pode dar ao parlamento a prerrogativa de revisão de áreas demarcadas e regularização fundiária das terras quilombolas, indígenas e Unidades de Conservação, tirando a atribuição que hoje é do Poder Executivo para o Legislativo.
Divididos em grupos, os participantes da conferência temática apontaram outros problemas que impactam na segurança alimentar e nutricional dessas populações. Os potiguara reivindicam, por exemplo, que técnicos agrícolas indígenas sejam contratados para dar assistência técnica agropecuária nas aldeias. Alegam que técnicas tradicionais de cultivo indígena vêm sendo esquecidas e que poderiam ajudar na orientação agrícola para aqueles índios que queiram retomar a produção agrícola.
Eles exigem também contratação de mais nutricionistas para orientar as famílias na obtenção e preparo de alimentação saudável. Os tabajara, que possuem um núcleo vivendo em área da reforma agrária na região do Conde, reclamam que as escolas que atendem às crianças e jovens da comunidade sofrem constantemente desabastecimento da merenda escolar. Dizem também que não se tem garantido o transporte escolar para as crianças e jovens que moram nas regiões mais afastadas da cidade.
Uma das denúncias mais graves apresentadas pela comunidade tabajara diz respeito ao programa de distribuição de cestas básicas. “Recebemos, de vez em quando, 50 cestas que vêm pela CONAB destinadas aos potiguara, e são repassadas para a gente. Hoje nosso povo precisaria de, pelo menos, 150 cestas básicas de alimento, mensalmente, que deveriam ser entregues diretamente a nós e não tirando da cota dos irmãos potiguara”, diz o cacique Edinaldo.
No território tabajara na região de Barra de Gramame, alguns índios reclamaram de que não existe um programa que os ajude na logística de distribuição de alimentos, quando eles produzem, e que os preços estipulados pelo Governo não compensam a despesa para a produção. No ano passado, um grande volume de macaxeira foi perdido porque não tinha como ser distribuído e não foi aproveitado nos programas como PAA e PNAE, na região.
Edinaldo diz que os agricultores indígenas deveriam ser dispensados da DAP, porque a maioria não possui titulação da terra que cultivam. “É uma burocracia muito grande para o governo comprar nossa produção”, reclama. Na próxima semana ele estará participando em Brasília de uma reunião na FUNAI para definir a demarcação das primeiras áreas tabajara na Paraíba. “Ainda não sabemos o tamanho da terra, mas será uma grande conquista importante depois desses anos todos de luta, em que as pessoas diziam que nosso povo estava extinto”, comemora.
Os participantes do evento denunciaram ainda a tentativa de setores do agronegócio em tentar desqualificar as evidências históricas, sociológicas e antropológicas das populações indígenas nativas paraibanas. Criticaram o estudo realizado recentemente pelo antropólogo Cláudio Badaró, encomendado pela Federação da Agricultura e Pecuária na Paraíba (FAEPA), pelo Sindicato dos Produtores de Álcool (Sindálcool) e Associação dos Plantadores de Cana do Estado da Paraíba (ASPLAN). “O pesquisador, com certeza, não passou na nossa comunidade. Isso é mais um ataque dos latifundiários contra a organização dos povos indígenas”, disse o cacique Edinaldo.
Por Dalmo Oliveira – Edição Sérgio Ricardo