Filhos da Miséria
Já está sendo impossível esconder, a miséria tornou-se vitrine nas ruas. E isso nos faz sentir vergonha de sermos felizes. O mais impressionante é essa convivência silenciosa com a indigência crescente que se mostra estupidamente aos nossos olhos. Estamos sendo cúmplices do aumento das desigualdades sociais. Passivos, vemos o país transformar-se num cenário de famintos. Cegos, teimamos em não querer enxergar a realidade horrenda que se nos apresenta.
Irresponsavelmente continuamos rejeitando os miseráveis, muito mais do que a miséria. As estatísticas revelam que cada vez mais aumenta o número de brasileiros que passa a viver em situação de extrema pobreza. A vulnerabilidade social se acentuando. Entretanto, preponderam as inconveniências derivadas da insensibilidade social e carência de senso humanitário, contribuindo para que essa situação só faça piorar. Chegamos ao cúmulo de classificar como sendo “comunistas” os que defendem “programas de inclusão social”, numa manifestação explícita de analfabetismo político.
Estamos sendo vítimas de uma miopia histórica, aderindo à ideologia perversa dos que não têm a preocupação em lutar pelas oportunidades igualitárias para todos, indistintamente. Nosso comodismo compactua com as injustiças sociais, ao nos comportarmos adotando a inércia e a lógica individualista diante desse terrível mal que se abate sobre a nossa sociedade. As demandas da coletividade são desconsideradas, em favor da manutenção dos privilégios para alguns. É muito preocupante quando perdemos a capacidade de ver e de sentir essa tragédia humana. Bloqueios mentais nos levam à indiferença diante do sofrimento daqueles que estão ao nosso redor.
Até quando teremos ouvidos moucos ao clamor das camadas sociais vítimas da estrutura social injusta e excludente? Não estou pregando uma revolta popular. Estou apenas tentando, num exercício de “mea culpa”, despertar em cada um de nós a consciência da responsabilidade solidária para que se diminua a distância entre os muitos que têm pouco e os poucos que têm muito. Os miseráveis não carecem apenas de bens materiais, mas, sobretudo, de dignidade humana e garantia de plena participação social e política. Saiamos da zona de conforto em que nos preocupamos apenas em manter “status social”, desatentos aos dramas humanos vivenciados por uma multidão de compatriotas.
Não vejamos o clamor dos “filhos da miséria” como uma ameaça aos que se mantém na zona de conforto, e sim como um apelo à efetivação de atitudes práticas capazes de sensibilizar-se com o sofrimento humano.