Equidade no SUS aponta desafios

Políticas de Promoção da EquidadeNo início da semana passada voltei à Brasília em mais uma atividade do Conselho Nacional de Saúde (CNS), participando da construção do Plano de Trabalho da Comissão Intersetorial de Políticas de Promoção da Equidade (CIPPE). Entre vários outros encaminhamentos, a comissão tirou moção sobre a violência no campo e recomendou a realização da 1ª Conferência Nacional de Saúde da População Negra.

A CIPPE iniciou ainda um mapeamento de comitês de segmentos relacionados à defesa da equidade nos estados. Na Paraíba, pelo menos quatro destes comitês foram criados e funcionam desarticuladamente. A ideia é unificar todos num único colegiado, a exemplo do que ocorreu no âmbito do CNS.

Conselheiros, ligados ao Movimento de População de Rua, trouxeram suas preocupações sobre a questão da higienização humana patrocinada pelo prefeito João Dória na Cracolândia em São Paulo. Membros da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) relataram que, no Espírito Santo, há um grave retrocesso no serviço do SAMU. Em dois dias de reuniões os conselheiros discutiram também o processo transexualizador no SUS, previsto na Portaria 2.803.

Segundo representantes da população transexual, há uma demanda crescente e se faz necessário que os procedimentos possam ser realizados em outros hospitais públicos, além dos hospitais universitários, como ocorre hoje. Defenderam a criação de um cadastro centralizado para regular as cirurgias eletivas. A Paraíba aparece como estado de referência, tendo implantado ambulatório especializado em João Pessoa.

O processo transexualizador ainda é um desafio no âmbito da Saúde Coletiva brasileira. Além das cirurgias modificadoras, o beneficiário precisa de acompanhamento psicológico antes e depois dos procedimentos. As operações cirúrgicas dos órgãos sexuais e plásticas são acompanhadas também de uma cuidadosa terapia hormonal.

PLANAFE

Mariana Schneider, da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde (MS), apresentou detalhes do Plano de Fortalecimento das Comunidades Extrativistas e Ribeirinhas (PLANAFE), numa parceira do MS com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Ela disse que hoje são cerca de 234 mil famílias vivendo e trabalhando em Unidades de Área de Ocupação de Uso Sustentável. Levantamento do MMA constatou que 48,8% das florestas públicas federais são ocupadas e utilizadas economicamente pelos povos e comunidades tradicionais, o que corresponde a cerca de 153 milhões de hectares. O PLANAFE é uma demanda histórica do Conselho Nacional de Seringueiros (CNS), conquistada com o III Chamado da Floresta. O Plano foi instituído pela Portaria Interministerial 380, de dezembro de 2015, assinada pelo MMA, MDA e MDS.

CNS alerta para explosão da violência no campo

Os membros da CIPPE, reunidos durante sua 3ª Reunião Ordinária, em Brasília, nos dias 2 e 30 de maio, recomendaram ao Pleno do CNS a emissão de uma Nota Pública ao Povo Brasileiro e às autoridades constituídas, expondo a extrema preocupação deste Colegiado em relação ao crescente surto de violência no campo no Brasil, tendo como mais novo e terrível episódio o massacre covarde de mais de uma dezena de lideranças de agricultores no estado do Pará.

O assassinato de nove homens e uma mulher, na manhã do último dia 24, em um acampamento na Fazenda Santa Lúcia, no município de Pau d’Arco, no Pará, ascende novamente o sinal de alerta para as ações violentas do aparato policial de Estado contra a população civil. Neste último cruel episódio, uma reintegração de posse acabou sendo transformada em ato bárbaro de componentes das Polícias Civil e Militar do Pará, estado que já possui um longo histórico desse tipo de agressões aos direitos humanos.

De acordo com o presidente do CNDH, Darci Frigo, o Brasil vive um momento de acirramento e generalização da violência no campo. “Há uma omissão ou conivência do próprio Estado, principalmente do Executivo, mas também do Legislativo e de setores bem significativos do Judiciário, que não respondem mais e estão incitando direta e indiretamente essa violência. É preciso uma reação conjunta para enfrentar a situação de violência e de ameaças que estão acontecendo no campo”, declarou Frigo em recente reunião para discutir a problemática.

Já para a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), representantes de setores do latifundiário e de organizações do agronegócio estão no centro da disputa pela terra e têm estimulado, em total afronta às Leis Brasileiras, esse tipo de conflito contra trabalhadores rurais, indígenas, populações ribeirinhas, quilombolas e demais segmentos excluídos do direito à terra. Em abril foram registrados ataques a índios Gamela, no Maranhão, e o assassinato de trabalhadores rurais em Colniza, no Mato Grosso.

Para a CIPPE, o aumento da violência no campo é sintoma inequívoco de uma cultura de extermínio que exibe sem constrangimentos sua voracidade na época atual, num Brasil pós-golpe. Reflete ainda a negligência (e em muitos casos, a conivência) dos Poderes Públicos constituídos da República Brasileira.

Preocupante ainda, o modelo de abordagem que diversos meios de comunicação, notadamente da Imprensa empresarial nacional, ao tratar as vítimas da violência como criminosos. A naturalização dos desfechos destes conflitos agrários, pela mídia, tem se tornado um desserviço ao processo civilizatório brasileiro.

Os crimes violentos contra as populações rurais e os líderes dos movimentos campesinos funcionam ainda como instrumento de ameaça ao restante da população civil, que entende nos assassinatos um óbvio recado dos que praticam a barbárie: “não se organizem, não reivindiquem, não se atrevam!”.

Os membros da comissão conclamam o CNS a se juntar à mobilização das instituições abaixo mencionadas, para tentar frear a sanha dos exterminadores: Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Plataforma de Direitos Humanos Dhesca, Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), Terra de Direitos e Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem terra (MST). Do poder público estavam a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e representantes da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, da 6ª Câmara da Procuradoria Geral da República (PGR), da Defensoria Pública da União (DPU) e da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH). A reunião também contou com representação do escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil.

Por Dalmo Oliveira

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