Dez minutos no confessionário
No Brasil da extrema pobreza, da urgência sanitária, da crise profunda que vivemos atualmente, a grande imprensa dá destaque à notícia de que uma moça chamada Juliette demorou dez minutos no confessionário do reality show de uma televisão. A Assembleia da Paraíba aprovou medalha Epitácio Pessoa para essa Juliette, a mais nova subcelebridade do país. Consta que Juliette ganhou de outra figura cabível nesse status, obtendo mais seguidores nas redes sociais do que o tal controvertido personagem, aboletado no mais importante cargo da nação. A sociedade de massa precisa desses protagonistas frívolos e superficiais para se sentir inserida no consumo de bens e estar dentro do modelo de comportamento geral. A mídia se encarrega de fabricar tais figuras.
Eu fiquei particularmente curioso a respeito do que confessou essa moça durante dez minutos, e no que consiste o tal confessionário. Não vejo esse tipo de programa. Suponho que seja um retrato mal revelado de um Brasil real homogeneizado pelo mau gosto e a estupidez, tão em voga atualmente. Antes que me acusem de esnobe, faço saber que não vejo televisão de espécie alguma, exceção feita ao futebol e rápidas passadas nos noticiários. Compadre meu sempre assiste o tal reality show, apesar de “odiar” a patuscada. Explica que é para melhor falar mal da esbórnia televisiva no tal confinamento. Acho que, no fundo, ele ama espionar a vida alheia, mesmo que seja nessas apelativas exibições.
Pela generosidade do compadre Sérgio Ricardo Santos, editor de um portal em Bayeux, recebo convite para produzir um podcast semanal. Dá-se o nome de podcast a conteúdos em áudio publicados na internet. Conhecedor das manhas do mundo virtual, Sérgio deu a dica: falar sobre assuntos específicos para fidelizar ouvintes. Que coisas abestadas eu diria no tal podcast que fosse de interesse de possíveis receptores? Imaginei alguma coisa ligada aos trens, já que a única tarefa que exerci profissionalmente e da qual entendo um pouco é ferrovia. Mas, quem danado quer saber de trem, um fantasma enferrujado nos meus sonhos e no pesadelo da morte do sistema ferroviário nacional? Nos Estados Unidos, esse modal é igual um herói da nação. Apesar de adorarem o automóvel, mantêm sua gigantesca malha ferroviária. Aqui, mataram o trem, igual assassinam os índios, e enterram o passado em cova rasa, debaixo dos trilhos e dormentes podres. O Brasil exterminou sua rede ferroviária e, com ela, um pedaço da alma deste país estranho.
Foi aí que me lembrei da moça do reality show no confessionário. Expor pecados e pecadores e estimular o imaginário das pessoas em torno do jogo da privacidade e voyeurismo. O editor aprovou que o tal podcast teria o título de “Dez minutos no confessionário”. A estreia será em 25 de abril, Dia do Telégrafo sem Fio, aquele primitivo sistema de comunicação através de sinais elétricos. Coincidentemente, fui radiotelegrafista, talvez o último profissional a operar com a radiotelegrafia na Paraíba. Transitei do Código Morse ao podcast ultramoderno, o que me faz um elemento altamente carregado de confissões para revelar.
Aqui onde moro atualmente, nos confins da cordilheira da Borborema, meus vizinhos escassos não têm internet e jamais saberão notícias dos meus segredos confidenciados no tal confessionário eletrônico. É um povo bom, humanitário, esse do interior. Essas pessoas não trocam mensagens a toda hora pelo WhatsApp, mas, se você passar na frente das casinhas com ar triste ou apressado ou mostrando sinais de abatimento, a comunidade corre para saber o que aconteceu, como pode ajudar. Falarei sobre eles na primeira edição do podcast. Em dez minutos contarei a história da mulher da quitanda que rejeitou meu doce de jaca porque tal amabilidade entre vizinhos poderia estragar nossas relações comerciais. A narrativa é interessante, garanto.
Para ouvir o podcast “Dez minutos no confessionário”, dia 25 de abril, às 10 horas: https://www.radio.diariopb.com.br/