Poucas vezes uma estatal ocupou tanto o foco do debate político. Com cerca de 98.000 funcionários, os Correios constituem a maior empresa empregadora do setor público no país, o que por si só bastaria para explicar as celeumas em torno de sua privatização.
Com um delicado equilíbrio financeiro, a estatal foi incluída no plano de desestatizações do governo – e se tornou uma das estrelas do programa. Agora, cabe aos parlamentares decidir o futuro da empresa: a privatização dos Correios, que está na pauta de votação do Congresso nesta quinta-feira, 5.
Mas a bola está em campo e o jogo ainda pode virar contra o governo. Com sindicatos influentes, representantes dos servidores da estatal vêm intensificando o lobby no Parlamento. A disputa, agora, é pelo Centrão. Nos últimos dias, os sindicatos da categoria se reuniram com deputados de partidos como o MDB e PTB, em um corpo a corpo intenso.
A Federação Interestadual dos Trabalhadores e Trabalhadoras dos Correios (Findect) fez uma ampla campanha contra a privatização em diversos estados – e deve convocar um protesto em frente ao Congresso nesta quinta, 5, contra o projeto de lei que acaba com o monopólio dos Correios sobre o serviço postal.
Também entrou em pauta um imbróglio jurídico – esse sim, mais delicado. De acordo com a Constituição, a União deve manter o serviço postal. Isso está previsto em de uma lei de 1969 que criou a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Os Correios já existiam desde os tempos do Brasil Colônia, mas foram elevados à estatal federal há 52 anos.
Para manter a universalização do serviço, o projeto de lei dispõe do mecanismo de concessão das entregas de cartas e documentos. O vencedor da licitação deverá assinar um contrato com o governo federal a fim de garantir a continuidade das entregas postais em todo o território nacional.
“O projeto de lei preconiza que manter o serviço postal é garantir que se tenha o olhar atento do governo na delegação do serviço obrigatório em todo o território nacional”, diz Martha Sellier, secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do Ministério da Economia, que participa das discussões sobre as privatizações. “Esse é o timing perfeito para a desestatização, com grandes empresas do setor de logística e e-commerce olhando com interesse para a venda de uma das maiores empresas de entregas da América Latina, em momento no qual as compras online crescem muito”.
Além disso, há uma preocupação de que os Correios possam se tornar dependentes de recursos públicos, pagos com dinheiro do contribuinte: 18 estatais se encontram nessa situação atualmente, entre elas a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e a Companhia de Desenvolvimento dos Valores do Rio São Francisco e Parnaíba (Codevasp). Juntas, elas devem consumir 21,8 bilhões de reais dos cofres públicos este ano, segundo dados do Tesouro.
“Os Correios usufruem de isenção tributária, algo que precisa ser levado em conta ao se analisar o balanço da companhia”, diz Diogo Mac Cord, secretário especial de desestatização do Ministério da Economia. Segundo cálculos da pasta, caso não houvesse esse benefício, a empresa teria desembolsado cerca de 1,5 bilhão de reais em impostos em 2020, mesmo valor do lucro apurado no período.