Civis fogem do norte de Gaza após ultimato de Israel; acompanhe
Autoridades israelenses avisaram aos moradores da Faixa de Gaza que o norte da região deve ser desocupado em 24 horas, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
Isso significa que todos os residentes, incluindo mais de um milhão de moradores da Cidade de Gaza, devem abandonar suas casas e se dirigirem ao sul da Faixa, para sua “segurança e proteção”.
Após o ultimato, civis palestinos estão fugindo do norte de Gaza de carro, na carroceria de caminhões e a pé rumo ao sul do país. Muitos, no entanto, não têm para onde ir.
O comunicado foi divulgado ao mesmo tempo em que as forças militares de Israel reúnem um enorme contingente ao redor da Faixa de Gaza criando a expectativa de uma iminente invasão por terra.
A ONU diz que uma invasão teria uma “devastadora consequência humanitária” e pediu que Israel reconsidere a ordem de evacuação.
O grupo militante extremista palestino Hamas mantém pelo menos 150 pessoas como reféns desde os ataques de sábado (7/10) em que foram mortas cerca de 1.300 pessoas, segundo autoridades israelenses.
Desde então, mais de 1.400 pessoas foram mortas na Faixa de Gaza, segundo autoridades palestinas, em consequência dos sistemáticos bombardeios aéreos com que Israel tem retaliado a ofensiva do Hamas.
Além dos bombardeios, Israel impôs um cerco total à Faixa de Gaza mantendo a população sem fornecimento de água, luz, combustível, alimentos e remédios.
Israel diz que o fornecimento não será restabelecido até a libertação dos reféns pelo Hamas.
O correspondente da BBC em Jerusalém, Tom Bateman, diz que a ordem de Israel é praticamente impossível de ser cumprida. “São mais de um milhão de pessoas a serem deslocadas em 24 horas o que vale dizer 40 mil a cada hora.”
Em entrevista para a agência de notícias AP, uma porta-voz do Crescente Vermelho, Nebal Farsakh manifestou preocupação com os feridos que não podem ser removidos.
“E nossos pacientes? Nós temos gente ferida, idosos, crianças internadas em nossos hospitais.”
Ela acrescentou que diversos médicos estão se recusando a deixar os hospitais e abandonar seus pacientes.
A ONU afirmou, por meio do Food World Programme, que a situação na Faixa de Gaza é “terrível” por conta do corte imposto por Israel no fornecimento de comida, água, energia e outros suprimentos.
“A situação é devastadora (em Gaza)”, disse Samer Abdeljaber, diretor do programa da ONU na Palestina. “Estamos fazendo tudo o que podemos para garantir que as pessoas necessitadas, as que fugiram das suas casas, as que vivem em abrigos, recebam a comida e a ajuda de que necessitam para sobreviver.”
Em comunicado, a organização afirma “estar profundamente preocupada” com o impacto que o conflito entre Israel e o Hamas pode ter na população civil da região.
A entidade diz ter começado a distribuir pão fresco e comida enlatada para pelo menos 100 mil pessoas que procuraram ajuda em postos da ONU e de outras agências de assistência na Faixa de Gaza.
Estima-se que ao menos 300 mil pessoas tiveram que deixar suas casas.
Tropas de Israel continuam cercando o entorno da Faixa de Gaza mantendo a população local sob total controle. Ninguém sai ou entra do território que teve o fornecimento de água e luz interrompido.
Outro órgão da ONU, o Fundo de População das Nações Unidas, também afirmou que a situação é “desesperadora” para 50 mil mulheres grávidas que atualmente não têm acesso a serviços de saúde essenciais ou mesmo a água potável.
Segundo a entidade, 5.500 dessas mulheres deverão dar à luz no próximo mês.
O ministro israelense da Energia, Israel Katz, afirmou que o fornecimento de suprimentos e recursos básicos, como água e eletricidade, só será restabelecido quando o grupo radical Hamas liberar os reféns que foram levados para Gaza durante o ataque de sábado.
“Nenhuma tomada será ligada, nenhuma torneira terá água, nenhum caminhão tanque vai entrar em Gaza,” disse Katz.
Estima-se que pelo menos 150 pessoas tenham sido levadas pelo Hamas e mantidas como reféns pelo grupo.
Entre os mortos em Israel, estão dois brasileiros, o gaúcho Ranani Nidejelski Glazer, de 23 anos, e a carioca Bruna Valeanu, de 24. Eles foram vítimas de um massacre em evento que era a versão israelense do festival de música brasileiro Universo Paralello.
“Falhas de segurança” de Israel
Já o chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa de Israel, o tenente-general Herzi Haveli, reconheceu nesta quinta-feira que houve “falhas de segurança” durante a invasão de integrantes do Hamas, no sábado.
Porém, segundo ele, “ainda não é o momento de investigar o que deu errado”.
“As forças de defesa são responsáveis pela segurança do país e de seus cidadãos e, na manhã de sábado, na fronteira da Faixa de Gaza, não cuidamos disso. Vamos investigar, vamos aprender, mas agora estamos em guerra”, afirmou ele, segundo o jornal Times of Israel.
Mais cedo nesta quinta-feira, o secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, prometeu apoio “inabalável” a Israel durante uma visita ao país.
Ele acrescentou que Israel “nunca estará sozinho” e que a forma como o país se defende agora “importa” e que “é muito importante tomar todas as precauções possíveis para evitar ferir civis”.
A demonstração de apoio dos EUA acontece no momento em que as forças israelenses se mobilizam na fronteira com Gaza enquanto se especula se o gabinete de guerra instalado em Israel tomará a decisão de fazer uma incursão por terra no território.
Além das dificuldades e percalços de uma operação do tipo, neste caso Israel enfrenta um duro dilema estratégico por causa dos reféns em poder do Hamas. “Vale tentar uma missão de resgate armado – altamente arriscada? Ou espera-se mais, até que o Hamas esteja tão enfraquecido pelos ataques aéreos que possa estar mais disposto a negociar um acordo?”, analisa Frank Gardner, correspondente de segurança da BBC.
Encontro com Autoridade Palestina
Nesta sexta, Blinken deve se encontrar com o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, e com o rei Abdullah 2º da Jordânia.
Nesta quinta, Abbas, que é um ferrenho opositor do Hamas, falou publicamente pela primeira vez desde o ataque surpresa do Hamas a Israel, no último sábado. Já está na Jordânia, ele apelou ao “fim imediato da agressão abrangente contra o povo palestino”.
De acordo com um comunicado divulgado pelo gabinete do presidente, Abbas rejeitou “práticas relacionadas com o assassinato de civis ou o abuso em ambos os lados”.
Os dois líderes se reuniram em Amã para discutir “formas de travar a agressão israelense contra o povo palestino e entregar ajuda e alívio” a Gaza.
De acordo com o comunicado, ele também enfatizou que os palestinos “renunciam à violência e aderem à legitimidade internacional” e disse que os ataques a civis tanto pelas forças israelenses quanto pelo Hamas “violam a moral, a religião e o direito internacional”.
O grupo assumiu o controle de Gaza em 2007, expulsando forças leais à AP no então governo e ao movimento Fatah de Abbas, após uma ruptura violenta.
‘Corredor humanitário’
Nesta sexta-feira, a ONU fará uma reunião do Conselho de Segurança, atualmente presidido pelo Brasil, para discutir a situação do conflito na Faixa de Gaza.
A BBC News Brasil apurou que Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores e presidente da sessão da sessão, tentará aprovar a montagem de um corredor humanitário em Gaza com a anuência dos demais membros do conselho.
Na noite desta quinta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que conversou com o presidente de Israel, Isaac Herzog, para agradecer “o apoio para a operação de retirada dos brasileiros (de Israel) que desejam retornar ao nosso país”.
“Reafirmei a condenação brasileira aos ataques terroristas e nossa solidariedade com os familiares das vítimas”, escreveu Lula nas redes sociais.
“Solicitei ao Presidente todas as iniciativas possíveis para que não falte água, luz e remédios em hospitais. Não é possível que os inocentes sejam vítimas da insanidade daqueles que querem a guerra. Transmiti meu apelo por um corredor humanitário para que as pessoas que queiram sair da Faixa de Gaza pelo Egito tenham segurança”, finalizou o petista.
Na quarta-feira, o secretário-geral da ONU, António Guterres, também fez um apelo para que suprimentos essenciais possam chegar aos civis na Faixa de Gaza em meio aos bombardeios de Israel.
“Suprimentos cruciais para salvar vidas, incluindo combustível, alimentos e água, devem ser autorizados a entrar em Gaza. Precisamos de acesso humanitário rápido e desimpedido agora”, disse Guterres.
Os Estados Unidos estão trabalhando com Israel e Egito para estabelecer uma rota de passagem segura para civis para fora de Gaza, disse a Casa Branca.
O governo egípcio também mantém discussões com os envolvidos no conflito para que haja uma trégua para fornecer ajuda humanitária na Faixa de Gaza.
“Quero agradecer o Egito pelo seu empenho em facilitar o acesso humanitário através da passagem de Rafah e em disponibilizar o aeroporto de El Arish para assistência crítica”, disse Guterres.
BBC NEWS BRASIL