Brasil desponta como líder global na transição energética, aponta estudo
Pesquisa da Johns Hopkins destaca potencial do país em setores estratégicos, mas alerta para desafios na política industrial e foco nos investimentos
O Brasil está entre os quatro países com maior capacidade para liderar a transição energética global, segundo um estudo do Net Zero Industrial Policy Lab (NZIPL), laboratório da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, ao qual o jornal Valor teve acesso com exclusividade. O levantamento destaca que o país possui vantagens competitivas significativas para desenvolver uma indústria verde robusta até 2050, mas alerta para desafios na formulação e execução de políticas públicas.
De acordo com a pesquisa, o Brasil se destaca em sete áreas estratégicas para a economia verde: minerais críticos, baterias, veículos elétricos híbridos com biocombustíveis, combustíveis sustentáveis para aviação, equipamentos para energia eólica, aço de baixo carbono e fertilizantes verdes. Além da abundância de recursos naturais, um diferencial do país em relação a outros concorrentes é a base industrial já constituída. No entanto, os pesquisadores alertam que a falta de clareza no direcionamento dos investimentos do programa Nova Indústria Brasil (NIB) pode comprometer a efetividade do plano.
“Os R$ 468,38 bilhões previstos correm o risco de serem pulverizados em muitas prioridades, reduzindo o impacto das ações”, aponta o relatório. A pesquisa sugere que o governo adote uma estratégia de “microtargeting”, concentrando esforços nas áreas com maior potencial de liderança global.
O estudo é liderado por Tim Sahay, especialista em políticas climáticas e diretor do NZIPL. Ele defende que o Brasil pode se consolidar como potência na economia verde se priorizar nichos estratégicos dentro dos setores apontados. “Usamos o termo ‘microtargeting’ por um motivo. Em baterias, por exemplo, argumentamos que focar em componentes intermediários como ânodos poderia alavancar os pontos fortes do Brasil no processamento de grafite e silício”, explicou Sahay ao Valor. Ele destacou que iniciativas recentes do BNDES e da Finep para projetos de minerais críticos são um passo na direção certa, mas defendeu maior precisão nas políticas de incentivo.
Para o pesquisador, o governo já dá sinais positivos ao convocar grupos de trabalho para mapear cadeias produtivas e fortalecer setores estratégicos. “Isso é bem-vindo, mas essas ações já deveriam ter sido feitas antes”, ponderou. Ele também enfatizou a importância de integrar as oportunidades setoriais em um sistema mais amplo. “O Brasil não precisa apenas fornecer capital e suporte a projetos, mas criar condições estruturais para a transformação, com investimentos em infraestrutura, capital humano e energia barata”, avaliou.
O estudo da Johns Hopkins analisa ainda o impacto de possíveis retrocessos na agenda de transição energética global. Sahay observa que a postura do ex-presidente americano Donald Trump, caso retorne ao poder e reduza incentivos às energias renováveis, não deve barrar o avanço da nova economia verde. Da mesma forma, ele avalia que a descrença do presidente russo, Vladimir Putin, nas energias limpas pode prejudicar a competitividade da Rússia a longo prazo.
Além do Brasil, os outros três países apontados pelo levantamento como potenciais líderes na transição energética são Estados Unidos, Rússia e China. Segundo o estudo, a forte aposta chinesa na descarbonização já impacta negativamente a demanda global por petróleo. “Os EUA sob Trump e a Rússia de Putin estão atirando nos próprios pés ao desacelerar a transição, prejudicando seus empregos futuros, a produtividade e a competitividade”, afirma Sahay.
Para o especialista, o Brasil tem uma escolha estratégica a fazer. “O mundo está se movendo rápido, e a nova economia verde não é uma utopia colaborativa. Haverá vencedores e perdedores. Com o grande potencial que possui, os líderes brasileiros, tanto políticos quanto industriais, têm uma oportunidade única nesta geração para aproveitar”, conclui.
Com Brasil 247