Bolsonarista, trumpista, lavajatista e sionista: quem é o juiz do Paraná que liberou assassino de Marcelo Arruda da cadeia
Gamaliel Seme Scaff se comporta como um ativista das redes sociais
Após o assassino bolsonarista do tesoureiro do PT Marcelo Arruda ser condenado a 20 anos de prisão pelo crime, o Tribunal de Justiça do Paraná manteve o regime de prisão domiciliar que vinha sendo aplicado a Jorge Guaranho, devido a “razões humanitárias”. A decisão, do relator do caso, Gamaliel Seme Scaff, atendeu a um pedido da defesa do bolsonarista e determinou sua “imediata” soltura.
Ele respondeu ao habeas corpus e disse que Guaranho “continua muito debilitado” em razão dos disparos que sofreu em retaliação ao ataque à festa de aniversário de Arruda em 2022, quando o bolsonarista invadiu o local para matar o petista. A decisão liminar estabeleceu uma série de medidas cautelares.
Ela veio um dia após o Tribunal do Júri de Curitiba decidir condenar o ex-policial penal federal a 20 anos de prisão por homicídio duplamente qualificado, em regime inicial fechado. Ele foi considerado culpado pelo assassinato de Arruda, ocorrido em julho de 2022.
O crime ocorreu em 9 de julho daquele ano, meses antes da eleição presidencial. Arruda comemorava seu aniversário de 50 anos tendo o PT e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como temática, quando foi atingido por tiros disparados de surpresa por Guaranho.
O caso se destacou com um dos mais violentos ocorridos em meio ao clima de polarização que marcou a campanha eleitoral daquele ano.
O Ministério Público do Paraná sustentou desde a apresentação da denúncia que o crime teve clara motivação política.
No entanto, os advogados buscaram desmontar essa tese, afirmando que seu cliente bolsonarista não nutria animosidade em relação ao PT. Os argumentos foram acolhidos por Scaff, que compartilha da ideologia de extrema-direita.
Mas quem é Scaff?
A página pessoal de Scaff no Facebook é marcada por postagens de viés conservador e de extrema-direita. Em uma análise rápida, destacam-se ataques a ateus, com afirmações de que estes “irão para o inferno” por não seguirem o cristianismo.
Além disso, Scaff exalta figuras como o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e ataca o que ele chama de “extrema esquerda”, grupo no qual inclui aqueles que votaram no presidente Lula. Ele também direciona ataques a ícones de esquerda, como Ernesto “Che” Guevara, e a países que classifica como ditaduras, especialmente a China e a Venezuela.
Outro aspecto recorrente em seu perfil é a publicação da frase judaica “Shabbat Shalom”, ao mesmo tempo em que ataca o presidente Lula por suas críticas ao genocídio palestino.
Além disso, ele se posiciona contra as recentes ações judiciais que buscam reparar as injustiças identificadas no âmbito da Operação Lava Jato.
Nota de Scaff
Leia abaixo a íntegra do posicionamento de Scaff sobre a decisão que liberou o assassino Guaranho da cadeia:
NOTA PÚBLICA
“O réu JORGE JOSÉ DA ROCHA GUARANHO não foi posto em liberdade, nem o será. CONTINUARÁ PRESO em prisão domiciliar diante do quadro de seu estado físico.
Diante da repercussão e equivocada interpretação à medida de MANUTENÇÃO DA PRISÃO DOMICILIAR COM MONITORAMENTO ELETRÔNICO ao réu JORGE JOSÉ DA ROCHA GUARANHO, já condenado a 20 (vinte) anos de prisão pelo assassinato do senhor Marcelo Aluizio de Arruda, trago a presente nota pública de esclarecimento.
Primeiramente, apresento o mais profundo sentimento de pesar, respeito e solidariedade humana à senhora Pamela Suellen Silva (viúva) e demais familiares e amigos da vítima Marcelo Aluizio de Arruda cuja vida foi estupidamente ceifada no dia de seu 50º aniversário pelo simples fato do réu, mostrando-se à época como um “idólatra” do ex-presidente Jair Bolsonaro, apesar de ser pessoa desconhecida da vítima e não convidada para a festa, mas por não haver gostado da temática escolhida a saber, com a logomarca do Partido dos Trabalhadores decorando a sala, bem como um cartaz com a imagem do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, veio a cometer esse crime bárbaro acerca do qual ressobra ao Judiciário trabalhar com os destroços e procurar aplicar o que resta de justiça a ser feita.
Em segundo lugar, faço questão de dizer que tal acontecimento também a mim causou e ainda causa enorme repugnância, seja pela estupidez de um crime absolutamente sem sentido, seja pelos resultados tão trágicos e de consequências tão avassaladoras para toda a família, para os companheiros de militância da vítima e para todas as pessoas de bem da sociedade paranaense que não toleram, nem regateiam com qualquer forma de injustiça ou opressão.
Mas há de se evitar interpretações equivocadas acerca dos fatos.
O réu JORGE GUARANHO CONTINUA PRESO E ASSIM CONTINUARÁ.
ELE JÁ ESTAVA EM PRISÃO DOMICILIAR COM USO DE TORNOZELEIRA e o que houve foi a manutenção dessa condição de modo a possibilitar a continuidade de seus tratamentos dado seu estado físico.
A CONDIÇÃO FÍSICA DO RÉU
O ato tresloucado do réu JORGE GUARANHO que ceifou a vida da vítima Marcelo não lhe ficou barato, pois foi também atingido pelos tiros defensivos da vítima, conforme se vê do vídeo que a tudo registrou e dos laudos médicos produzidos.
A vítima Marcelo acertou mais tiros no réu do que recebeu; acertou 9 (nove) tiros, sendo um deles na cabeça do réu JORGE GUARANHO, cuja bala não pode ser retirada e se encontra alojada em um dos hemisférios do seu cérebro. Além disso, foi alvejado em outras partes do corpo. Como se não bastasse, já caído e alvejado, o réu enfrentou a indignação dos presentes e amigos da vítima que passaram a desferir-lhe chutes e pontapés nas regiões da cabeça, costelas, pernas etc. Disso resultaram fraturas múltiplas, tendo inclusive tido a perda do maxilar e dentes, com incapacidade de mastigar alimentos e dificuldade de deglutição (para engolir), sentindo muita dor para mastigar, com falta dos dentes e dificuldade para engolir por conta do que, sofreu a perda de 30Kg de seu peso normal apresentando grave problema nutricional. Além disso, quando estava na prisão, com uso de muletas, por não conseguir se equilibrar, caiu e sofreu uma fratura num dos braços. Precisou de cadeira de rodas e de auxílio para tudo, até para higiene pessoal em suas necessidades fisiológicas, porque o outro braço já não responde. Não bastasse, os múltiplos golpes recebidos na cabeça aliado ao projétil alojado em seu cérebro, parece ter alterado de modo permanente suas faculdades intelectivas, conforme relatório médico posto no PARECER TÉCNICO FORENSE firmado pelo Doutor Weuler Esmerio Batista de Oliveira (CRM/PR 53.833) juntado aos autos:
“Jorge, desde o início das avaliações apresentou ainda sintomas neuropsiquiátricos, tais como ANSIEDADE, INSÔNIA DÉFICITS DE MEMÓRIA E ATENÇÃO, ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO E ALUCINAÇÕES, assim como déficits neurológicos e uma PIORA DA MEMÓRIA COM DIFICULDADE DE CONCENTRAÇÃO E DÉFICITS VISUAIS. Quanto ao aspecto neuropsiquiátrico e os déficits visuais, estes permaneceram até a última avaliação ocorrida em 14/09/2023, O QUE LEVOU A SE CONSIDERAR QUE AS SEQUELAS SEJAM PERMANENTES, havendo uma incapacidade laboral.”
O réu tem estado sujeito a cirurgias múltiplas, tendo já se submetido a cirurgia bucomaxilofacial e fonoaudiologia necessitando de ser acompanhado para todas as necessidades.
O CMP (Complexo Médico Penal) tem feito o que pode e o que não pode pelos internos que para lá são remetidos, mas para tudo há limite de recursos e possibilidades. E nesse sentido, já houve mais de uma manifestação por parte do competente corpo clínico e administrativo nos autos, dando notícia de que o caso do réu JORGE GUARANHO demanda atendimento e acompanhamento incompatível ao CMP, conforme é exemplo o seguinte despacho exarado pela DIVISÃO CLÍNICA E CIRÚRGICA daquele CMP:
“II. Avaliando o Laudo Médico subscrito pela Dra. GISELE DOS REIS CHERI (CRM 32.845) – Hospital Ministro Costa Cavalcanti – Foz do Iguaçu/PR, constata-se que o Paciente JORGE JOSÉ DA ROCHA GUARANHO se encontra com quadro clínico dependente de acompanhamento fisioterápico, nutricional e neurológico para sua reabilitação e dependente de terceiros para as atividades básicas do cotidiano, e portanto, INCOMPATÍVEL COM AS CONDIÇÕES ESTRUTURAIS ATUALMENTE APRESENTADAS POR ESTE COMPLEXO MÉDICO-PENAL.
III. Do ponto de vista técnico, este Complexo Médico-Penal NÃO REUNE CONDIÇÕES ESTRUTURAIS E DE PESSOAL APTA A RECEBER O PACIENTE.
É a informação.
A decisão condenatória no Tribunal do Júri, teria determinado o encaminhamento do réu para aquele Complexo Médico-Penal, para o cumprimento do restante da pena.
Ocorre que o réu ainda se encontra sob tratamento, buscando a recuperação de seu estado físico de modo a permitir que efetivamente vá para a Penitenciária Central do Estado ou mesmo ao Complexo Médico-Penal, neste a partir do momento em que profissionais médicos atestem que já se encontre ele réu, em condições físicas de sofrer o encarceramento comum.
Daí a razão na Defesa do réu haver impetrado um novo HC pleiteando justamente a “manutenção” da forma de prisão já imposta sobre ele, a saber, a prisão domiciliar que o permitisse dar continuidade ao tratamento perante as unidades do SUS.
Esta foi a razão da concessão da liminar apenas para manter a prisão domiciliar do réu, jamais a sua soltura como foi interpretado, certamente, a partir da leitura apressada do jargão jurídico costumeiramente utilizado nessas decisões.
RECOMENDAÇÃO DO STF QUANTO A DIGNIDADE NO SISTEMA PRISIONAL
Dia 18/12/2024 por maioria, o STF aprovou plano de melhorias no sistema prisional para compensar presos por encarceramento degradante, conforme noticiou o site da CNN.
No caso, o réu, se sobreviver aos tratamentos, segundo avaliações médicas feitas até aqui, parece que nunca mais será o mesmo o que não o eximirá de ver seu corpo cumprindo a pena ainda que a sua psique possa eventualmente não mais lhe corresponder.
A despeito de toda a repulsa que o ato praticado pelo réu mereça (e merece), o fato é que nesta quadra o que restou de sua vida, seu estado é de um moribundo, enfermo, incapacitado e dependente.
Foi-se o tempo dos linchamentos públicos em que toda a expressão de vingança era manifestada nas execuções públicas espetaculares. O iluminismo para isto serviu bem ao mundo, trazendo um pouco mais de civilidade aos povos, de modo que, enquanto a lei nos permitir, devemos oferecer humanidade até mesmo àquelas pessoas que pareçam não merecer o favor humano. Esta será certamente, a melhor parte de nós mesmos. Chamam-na de misericórdia nas religiões, sendo inegavelmente civilizatória e elemento distintivo entre a civilização e a barbárie.
CONCLUSÃO
Por último, devo lamentar a falta de melhor clareza por parte do texto contido na peça processual que assinei pelo que me penitencio perante os jurisdicionados, mas especialmente perante familiares e amigos da vítima que por certo ficaram chocados com a “versão” noticiada, algumas delas com uma carga de sentimento similar àquele que levou o réu a cometer o repulsivo crime, só que em viés oposto.
Juiz só deve se manifestar nos autos. Porém, diante do quadro polarizado encerrado até nos próprios fatos postos em julgamento e em atenção ao direito das pessoas saberem qual a motivação jurídica de uma decisão como essa, achei por bem oferecer os presentes esclarecimentos como instrumento de pacificação.
Sim, para que haja tranquilidade e descanso quanto à condução das coisas do Estado, das coisas da Justiça por estas bandas paranaenses, certo que nunca existirá tal confiança se essa justiça aplicada foi parcial, bolsonarista, lulista, petista ou qualquer outro “ista” que a macule, porque então já não seria justiça, mas uma extensão espúria e contaminada de seu mero espectro. Mas de forma alguma é o caso.
Hoje é dia de sábado, o shabbat bíblico que significa “descanso” e que é saudado com um dia de paz. É o shabbat shalom!
Meu desejo é que as pessoas, não importa sua preferência política ou religiosa, voltem a conviver em paz no Brasil como se cada dia fosse um shabbat shalom, pois precisamos de paz. O Brasil precisa de paz. O mundo precisa de paz. Que haja paz!
Shabbat Shalom!
Desembargador GAMALIEL SEME SCAFF
TJPR – 1ª CCr
DiariPB com Brasil 247