GERAL

Alguém me traduz solidariedade?

congressonacionalbbbTodas as vezes em que estou às voltas com as palavras fico se noção e quando essas mesmas palavras prestam-se a políticos deixam-me cada vez mais elementar. Então, o que é a palavra? Imagine que cada profissional de áreas diferentes tem concepção distinta dessa ideia. Para um filósofo, por exemplo, é uma unidade de sentido da expressão das ideias, mas também é uma forma de ludíbrio, de dissimular a verdade, de enganar. Diz São João, que no início era a palavra (verbum), diz Drummond, “Cada uma [palavra] tem mil faces secretas sob a face neutra”, Para um linguista saussuriano é apenas um signo de dupla face: o significante e o significado. Para um grego clássico era um elemento da comunicação que representava [mimetizava] a realidade, incapaz de expressar o que não se pudesse comprovar, ou seja, para eles, era impossível dizer com palavras o que não existisse; em outras palavras, era impossível mentir. Mas logo, eles se deram conta do contrário, mesmo antes de surgirem os sofistas.

E nós, o que dizemos? Ora, a palavra já foi tão gasta que existem países em que é obrigado existir cartórios para asseverarem à palavra aquilo que ela não tem mais. Essa falta de pudor com a palavra vem da península ibérica. Também pudera, né, onde em outro lugar do universo a palavra estaria em mais desacordo com a realidade?

Todos sabem dos últimos acontecimentos políticos do país. A aprovação pela câmara federal do projeto de lei 4330/04 que libera totalmente a terceirização, ou seja, a morte do trabalhador; elimina a possibilidade de alguém sério trabalhar e ganhar um salário digno. Pois a partir dessa lei nenhuma empresa, pública ou privada, vai mais empregar diretamente nenhum funcionário. Vai imperar o que já existe à larga e impera no comércio: uma peste chamada atravessador, e ninguém se engane, essa nova peste, como sempre, virá da Europa, a peste sempre vem de lá. Como rezava o título de um livro dos anos 1980, Os demônios descem do Norte.

Claro que, como todos sabemos, no Brasil, funcionário público, de regra, não faz nada, salvo exceções. Mas o caminho para se corrigir tal vício não é esse que ora se toma. Se não vejamos: disseram-me que no tribunal de justiça do Estado da Paraíba há serventes concursados ganhando R$ 7.000.00, e outros terceirizados que recebem magros R$ 788,00. Então, como dizia Noel Rosa: “Onde está honestidade?” Penso não ser justo nenhum desses salários para um servente. Nem tanto ao mar nem tanto à terra como dizia o grande Antônio Vieira. Isso demonstra o grau de desequilíbrio em que é calcada esta sociedade, mal formada desde o início, porque invadida por uma outra degenerada. Tinha razão o velho Estagirita, quando pontificava: Virtus in media res.

Caro leitor, toda essa démarche para chamar atenção para uma coisa: Lembram-se do PSDB que queria melhorar o Brasil, pois o PT havia destruído-o? Dos 46 deputados, apenas 2 votaram a favor do povo, isto é, contra o PL 4330. E do PSB, que dizia portar o novo salvador, afirmando que o Brasil tinha jeito? Lembram? Pois eles agora estão começando dar um “geito” no Brasil. Dos 30 deputados, apenas 9 votaram a favor do povo. Todos sabíamos disso, por sabíamos que eles são capazes de tudo, exceto o bem.

Mas meu espanto foi o famigerado Solidariedade, partido fundado pela sacratíssima mulher-símbolo da luta-verde, Marina da Selva. Pois bem, seu rebento tornou-se um dragão devorador de polvo. Aquele que, segundo ela, seria um ajuntamento de portadores da Boa nova para o Brasil, tornou-se tubarões devoradores de extrema direita. Dos 14 deputados nenhum votou a favor do povo. Todos foram a favor dessa peste que ora se abate sobre o país. Senhora Marina, até agora, o que a senhora fez pelo Brasil é vergonhoso e odioso. E eu me pergunto: o que aconteceu com a senhora? Eu quero acreditar que era verdadeira sua militância no seringal do Acre, na Igreja Católica, no PT, no PV. Mas depois… não tenho palavras. É bem verdade que, como diz Maquiavel, o poder corrompe; e eu acrescento, a sede e a busca desenfreada pelo poder desequilibra, mas tudo tem limite. E o que aconteceu com o Solidariedade extrapolou todos os limites imagináveis. Se é ódio ao PT, asseguro-lhe que a sociedade brasileira é muito mais ampla e importante do que um partido.

Este partido não se dignou nem a respeitar um vocábulo evocado para as causas mais nobres e humanitárias. Anuncio desde já: este termo está maculado. A palavra solidariedade vem do latim “solidare”, significando etimologicamente “solidificar”, “confirmar”; que significa “o que tem consistência, que não é oco, que não se deixa destruir facilmente”. Mas que comumente a acepção mais utilizada é a de “sentire cum”, ou seja, irmanar-se ao outro pela empatia e buscar identificar-se com o sofrimento do outro, num momento de dor, dificuldade, tristeza ou abatimento. Pelo sim pelo não, solidariedade remeter para uma responsabilidade recíproca. Coisa que os deputados do Solidariedade jogaram no lixo esse significado, ao votarem em favor desse projeto desumano e monstruoso que entrega o povo brasileiro aos monstros-empresários-atravessadores de serviços, para ser triturado no moinho do capital.

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Redação DiárioPB

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