Ademir da Guia é escolhido o grande ídolo do Palmeiras no centenário do clube

Ademir da GuiaDesde o início da temporada, a torcida do Palmeiras canta nas arquibancadas uma música que virou lema em um ano tão importante para a história do clube. Para comemorar o centenário, os alviverdes entoam uma canção que tem como um dos principais trechos: “São 100 anos de histórias, de lutas e de glórias. Te amo, meu Verdão”.

E muitas dessas glórias tiveram como protagonista um carioca loiro, calmo, de fala mansa e dono de um futebol dos mais marcantes em todo o futebol nacional: Ademir da Guia. Todos os ex-jogadores ouvidos apontam o Divino como o maior craque da história do clube.

Nascido em 1942, em uma família de craques e boleiros, o talentoso meio-campista das passadas largas não demorou a despontar no Bangu. Domingos, o pai, foi zagueiro importante da seleção brasileira, do Flamengo, do Vasco, do rival Corinthians e de grandes clubes da América do Sul, como Boca Juniors, da Argentina, e Nacional, do Uruguai, enquanto os tios fizeram carreira no futebol carioca.

Mas foi Ademir quem herdou a carreira expressiva do pai. E praticamente em um clube só. Depois de uma excursão do Bangu para disputar um torneio em Nova York, nos Estados Unidos, o Palmeiras se interessou pelo talento promissor. E assim o jovem carioca assinou, em agosto de 1961, contrato com o Verdão, clube de onde só sairia ao término da carreira, em 1974.

– Estava começando a acreditar que poderia jogar quando o Palmeiras apostou no meu futebol e me deu essa oportunidade. Cheguei em 1961 e peguei aquele time que havia sido campeão em 1959 com Valdir, Djalma Santos, Chinesinho, Zequinha, Geraldo Scotto, Américo, Carabina, Julinho, Vavá, Romero. Cheguei e fiquei um ano e meio esperando uma oportunidade. Quem me colocou no time foi o Geninho. Tive um tempo para me adaptar ao futebol paulista – conta.

O tempo de adaptação foi importante para que Ademir, quando assumisse a condição de titular absoluto da equipe, não saísse mais. Vestindo a 10, ele parou de emocionar os torcedores palmeirenses somente após 900 jogos, 153 gols, diversos títulos importantes e um feito que jamais será superado: ter vestido a camisa 10 das duas Academias do Verdão.

– A primeira Academia surgiu no Rio-São Paulo. Nós jogávamos no Maracanã contra as equipes do Rio e eles lá diziam que nós mostrávamos um futebol acadêmico com gols, com bons resultados. Por isso surgiu esse apelido. A segunda Academia jogou mais tempo junto. Em 1972 nós conquistamos os cinco títulos que disputamos. Essa equipe, Leão, Eurico, Luis Pereira, Alfredo e Zeca; Dudu e Ademir; Edu, Leivinha, César e Nei, que tinha ainda o Ronaldo e Fedato que entravam, ficou marcada porque jogou mais tempo junta e conseguiu mais conquistas. A Academia entrava sempre favorita – recorda.

Carneiro, Divino, Maravilhoso – Com um estilo técnico, refinado e decisivo, Ademir comandou as Academias de Filpo Nuñez e Oswaldo Brandão nas décadas de 1960 e 1970. E, além dos torcedores, conquistou seus companheiros dentro de campo.

– O Ademir foi o melhor jogador que eu vi jogar. O Carneiro, o Divino, o Maravilhoso. O apelido dele era Divino entre nós, que éramos bons também – diz Emerson Leão, segundo atleta que mais vezes vestiu a camisa do Palmeiras, atrás apenas de Ademir.

Parceiro de Ademir em duas das formações das mais vitoriosas da história do Palmeiras, Dudu relembra os anos de parceria ao lado do craque da camisa 10.

– Eu precisei mudar minha característica de jogo para poder jogar com o Ademir. O Ademir já era campeão e veterano aqui no Palmeiras. Eu mudei a minha característica de volante versátil para volante mais fixo, procurando me aperfeiçoar em cobertura e marcação. Senão, não ia casar com o Ademir. E foi aí que deu certo. Eu precisei sacrificar o futebol que eu sabia fazer em benefício da equipe – conta Dudu.

Para muitos dos craques que fizeram história com a camisa do Palmeiras nas décadas de 1960 e 1970, o grande diferencial das Academias estava no meio de campo.

– O mais especial daquele time era a dupla de meio de campo: Dudu e Ademir. Eles já tinham jogado juntos em vários momentos do Palmeiras e tinham um respeito muito grande do grupo. Os dois foram muito marcantes. E depois vieram os outros, eu, César, Leivinha, Baldoch, Madurga, Edu, Nei – diz Luis Pereira.

– Dudu e Ademir eram 50% do time, os outros estavam para ajudar – define Edu.

O apelido – Ademir da Guia praticamente adotou o “Divino” como complemento do seu nome de batismo. Mas a ligação entre o ídolo e o apelido tem ligações familiares. Filho de Domingos da Guia, o jovem meia herdou parte do apelido do pai, conhecido como “Divino Mestre”.

O futebol de excelência apresentado durante as épocas das Academias do Verdão serviu apenas para eternizar ainda mais o nome ao seu clássico estilo de jogo.

– Eu tinha um estilo diferente, mas esse apelido pertencia ao meu pai. Ele foi campeão no Vasco, no Boca e no Nacional. E lá no Uruguai o apelidaram de “Divino Mestre”. Quando eu fui contratado pelo Palmeiras, alguns jornais colocaram na manchete: “Palmeiras contrata o filho do Divino”. Então eu herdei esse apelido – conta.

– Meu pai era um zagueiro muito técnico. Eu consegui herdar essa técnica dele. Como ele era zagueiro, jogava até o meio de campo. Eu já tive essa facilidade de ir e voltar. Era técnico e me preocupava muito em tocar as bolas para os meus pontas. Com o passar do tempo, eu entendi que podia fazer gols também, então cheguei mais e comecei a bater no gol – completa.

Maior ídolo do centenário – Ademir da Guia é praticamente um patrimônio histórico da Sociedade Esportiva Palmeiras. Por onde passa, o senhor de 72 anos sempre demonstra atenção para ouvir uma palavra de carinho, tirar uma foto e ser reverenciado até por quem não o viu vestir a camisa do Verdão nas conquistas do Campeonato Paulista (1963, 1966, 1972, 1974 e 1976), do Campeonato Brasileiro (1972 e 1973), do Torneio Rio-São Paulo (1965), do Torneio Roberto Gomes Pedrosa (1967) e da Taça Brasil (1967 e 1969).

Além de todo o reconhecimento das arquibancadas, o clube trabalha para manter a imagem do ídolo em alta. Na antiga sede social alviverde, um busto de Ademir – ao lado de Junqueira e Waldemar Fiúme – sempre foi um dos pontos mais visitados pelos torcedores. Agora, os três, acompanhados pelas homenagens aos ex-goleiros Oberdan Cattani e Marcos, farão parte do memorial palmeirense no novo estádio.

No Allianz Parque, aliás, o eterno camisa 10 da Academia terá lugar garantido em todos os jogos do Verdão. Homenageado pela WTorre, o craque entrou para a Academia de Imortais do clube, que presenteou ídolos do passado com cadeiras cativas vitalícias na nova casa dos palmeirenses. Tais manifestações emocionam até hoje o ex-jogador.

– É um orgulho muito grande. Quando você está passando por aquilo não consegue perceber. Mas ter jogado 901 jogos (Nota da Redação: o Palmeiras contabiliza 900 partidas oficiais) e ser o atleta que mais vestiu a camisa do Palmeiras, ter um busto no clube, ter conseguido cinco títulos do Paulista e cinco títulos do Brasileiro, ser campeão do século 20… Tudo isso é uma coisa que me enche de orgulho – finaliza.

 

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