Nos entreguerras do século XX, a humanidade viu nascer um dos movimentos mais cruéis perpetrados pela ânsia de poder e exercício de ódio contra os mais pobres: o Totalitarismo.
O Totalitarismo demostrou que ainda está vivo e com capacidade de mobilizar vários seguidores neste último final de semana na maioria das capitais brasileiras quando, atendendo a pedido do seu mais novo ídolo – o presidente Jair Bolsonaro – plantou fiéis na frente de quarteis do exército, pedindo a volta da Ditadura Militar e do famigerado AI-5- o ato governamental que tornou mais violentos os torturadores.
Quem assistiu às cenas televisuais ficou espantado com o espetáculo grotesco de demonstração de religiosidade e ódio – conjugados em um único objetivo: eliminar as barreiras que possam comprometer o projeto de realização das garantias políticas do grupo de apoiadores do presidente Bolsonaro.
Mas como se pode utilizar formas religiosas para pedir o retorno de aparatos tecno-burocráticos que torturam e matam aqueles que discordam da orientação política do líder?
Este amálgama não é facilmente explicável. Precisamos recorrer à filósofa e cientista política Hannah Arendt – alemã de origem judaica que, em seu livro, As origens do Totalitarismo, demonstra como os regimes fascistas e nazistas incorporaram a Banalidade do Mal como uma forma de tornar funcionários – militares ou civis – insensíveis à dor e ao sofrimento humano.
Há 59 anos(1961), cobrindo o julgamento de Eichmann (o oficial nazista que deportou os judeus para os campos de concentração) para uma revista norte-americana Hannah Arendt abriu uma nova linha de reflexão sobre os regimes totalitários buscando entender que o mal não estava apenas na pessoa que cometia crimes, mas era algo sofisticado, alimentado por uma estrutura burocrática, treinando seres humanos para que não tivessem consciências de suas ações.
Desta estrutura, surge o conceito de Banalidade do Mal, a maldade praticada a partir das tecnologias do Estado Totalitário – sem contrapartidas teológicas como a promessa e o perdão, caros a Santo Agostinho, objeto de estudo de Arendt.
Contando com o altruísmo de seus adeptos, os regimes totalitários, quer de esquerda, quer de direita, investiram no mal como uma atração mórbida, não importando se tivesse que matar o semelhante.
O Totalitarismo é uma técnica de dominação política que une misticismo religioso, espetacularização midiática e capacidade de promover uma série de violências individuais que impedem o pensamento social crítico sobre os sentimentos e afetos em coletividade, pois o que importa são as formas de satisfação material oferecidas pela industrialização (pensar nos futuristas) e por objetos de consumo.
Há, nos regimes totalitários, o uso exacerbado da propaganda política, um grande investimento na superficialidade humana e, sobretudo, projetos pedagógicos que embotam a capacidade de reflexão crítica, o que já vimos no começo do governo Bolsonaro através do programa Escola sem Partido.
Quanto menos juízo crítico houver, melhorar será para o Estado Totalitário, pois ele não vai perder tempo com experiências sobre a injustiça social, sobre os afetos que ligam e religam (religare) as pessoas na esfera pública.
O Estado Totalitário e o Totalitarismo Midiático, através da Banalização do Mal são estruturas burocráticas que ultrapassam a “Gaiola de Ferro” weberiana, porque procuram eliminar tudo que é sensível, promover uma desvalorização da política como exercício da cidadania, e coloca no centro da sociedade as violências anômicas e simbólicas.
Não há loucura nos discursos dos líderes totalitários e seus seguidores (Jair Bolsonaro e os falsos cristãos rezando pela volta da tortura), mas um projeto de dominação total para que a técnica seja usada como forma de livramento dos que impede o desenvolvimento econômico, velhos, crianças, negros, judeus, homossexuais,deficientes físicos e portadores de doenças crônicas consideradas custosas ao estado.
O Totalitarismo trabalha com a perspectiva de desenraizamento dos povos para obter mão de obra barata, escravos das baias dos telecentros, pequenos comerciantes de sonhos burgueses, enquanto a banalidade do mal se torna um recurso que apresenta a morte dos pobres das periferias das grandes cidades ocidentais como um acerto de contas entre o Bem e o Mal.