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54 conselheiros tutelares eleitos em 2023 estão envolvidos em casos criminosos, diz site

Entre os crimes cometidos pelas autoridades eleitas para proteger crianças e adolescentes, há casos desvio de dinheiro público, agressão infantil e até homicídio

Pelo menos 54 conselheiros eleitos em 2023 estão envolvidos em casos de improbidade, ilegalidades e crimes como agressão infantil, dívida de pensão e até homicídio. Isso é o que aponta o levantamento inédito do The Intercept Brasil, divulgado nesta segunda-feira (25).

De acordo com o site, a ficha dos quase 1,3 mil conselheiros eleitos em 25 capitais brasileiras foram analisadas. Apenas Boa Vista (RR) e Curitiba (PR) ficaram de fora devido aos sistemas dos Tribunais de Justiça de ambos estados não permitirem buscas amplas de processos judiciais.

A conclusão da análise mostrou que 54 conselheiros respondem a inquéritos, ações penais e ações civis públicas por crimes e atos de improbidade administrativa.O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) aponta como um dos requisitos para a candidatura  a “reconhecida idoneidade moral”. Para o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), isso é um “conceito jurídico indeterminado” que deixa a interpretação em aberto.

O conceito de idoneidade moral pode ser entendido como um conjunto de qualidades que dão ao indivíduo uma boa reputação na opinião pública, levando em conta atributos como honra, respeitabilidade, seriedade, dignidade e bons costumes.

“Nos casos em que os documentos analisados apresentam o candidato como investigado ou réu, ainda sem condenação transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado […], a Comissão Especial deve observar, detidamente, a gravidade dos fatos e se eles efetivamente desabonam sua idoneidade moral, o que não se confunde com o trânsito em julgado de ação penal, pois ‘nem tudo que é imoral é ilegal’”, afirmou o CNMP ao The Intercept.

Quem são os acusados

O levantamento do site apontou o histórico de três candidatos. Francisco Coelho de Souza Neto, de Manaus, foi indiciado por ter atropelado e matado o motociclista Alessandro da Silva Nascimento na Avenida Humaitá, enquanto estava embriagado, segundo o inquérito policial.

Daniel Castro Lima, técnico de enfermagem, é acusado de agressão infantil por ter dado um tapa no ombro um garoto de 9 anos enquanto realizava um ponto na criança. A denúncia foi feita pela mãe da vítima.

Outro conselheiro, Leidimar Ribeiro de Souza, conhecido como “Leidimar do Goiânia Viva”, é acusado, pelo Ministério Público de Goiás, de desvio de dinheiro público do programa Habitar Melhor, do governo estadual. O crime teria gerado um prejuízo de 2,3 milhões aos cofres públicos à época.

A presença da extrema direita nas eleições dos Conselhos Tutelares

Em setembro de 2023, um relatório da Sleeping Giants Brasil mostrou que a extrema direita estava se mobilizando nas redes sociais para as eleições do Conselho Tutelar através de discurso de ódio e notícias falsas.

Na época, a organização ressaltou que a manipulação da opinião pública através das fake news espalhadas pela extrema direita teria “sérias implicações para a integridade das eleições e, mais crucialmente, para a salvaguarda dos direitos das crianças e adolescentes em nossa sociedade.

De fato, as eleições de conselheiros em 2023 foi marcada por grande volume de candidatos de extrema direita e conservadores religiosos. Em São Paulo, por exemplo, um mapeamento feito pelo Instituto de Cooperação Pública e Social apontou que 60% dos eleitos seriam conservadores e ligados a igrejas neopentecostais

Uma das personalidades envolvidas nessa ascensão foi a senadora Damares Alves, ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e envolvida em diversas polêmicas envolvendo crianças e adolescentes.

Durante as eleições, a senadora declarou que os eleitores deveriam ficar atentos aos candidatos porque tinha “muita política nessa história”, e que não se poderia envolver política com candidatos a conselhos tutelares. “Tem muita ideologia também, se afaste das ideologias“, declarou.

A presença conservadora gerou um movimento nacional de conscientização sobre a responsabilidade das eleições para os conselhos tutelares. A ONG NOSSAS, de ativismo em prol da democracia, liderou, junto com organizações em defsa da infância,  a campanha “A Eleição do Ano”, que mobilizou não só políticos mas também artistas pelo país.

Financiadora dos atos golpistas

Entre os candidatos e candidatas eleitas está a pedagoga Josiany Duque Gomes Simas, de Cuiabá (MT), que apareceu como a quarta candidata mais bem votada para o 1º Conselho Tutelar.

Durante processo de apuração dos atos golpistas de 8 de janeiro, a Advocacia Geral da União indicou Josiany como uma das financiadores dos ataques. Ela e outras  58 pessoas físicas e jurídicas foram acionadas em uma ação civil pública de R$ 20,7 milhões por danos ao patrimônio público.

O que dizem os acusados

Procurados pelo Intercept, Francisco Coelho de Souza Neto disse que não tinha nada a declarar sobre o acidente envolvendo o motocicista.

Já Daniel Castro Lima afirmou que situação narrada em termo circunstanciado não passa de fofoca. “Quanto mais ganhamos força na campanha [eleitoral], pessoas maldosas começaram a inventar conversas”, acrescentando que nunca foi notificado oficialmente.

Leidimar do Goiânia Viva confirmou, por meio de sua defesa, a existência da denúncia do Ministério Público de Goiás, mas disse que “não condiz com a verdade dos fatos e isto será provado em tempo oportuno”. Seu advogado disse que “a denúncia fala em ORCRIM (organização criminosa e desvio de cheques reforma ou moradia), mas Leidimar sequer conhece as pessoas citadas no processo”.

Josiany Duque Gomes Simas também não quis se manifestar sobre as acusações.

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