GERAL

Mais uma tragédia programada

Vale tragediaO ato da escrita pode ser um grande prazer ou um enorme sofrer; dependendo do tema a ser tratado. Em se tratando de Brasil, se o escritor, crítico ou cronista é consciente e comprometido com a vida a segunda opção é bem mais frequente. É quase certa. Primeiro porque não dá para ficar discutido o sexo dos anjos ou admirando a beleza de um plenilúnio, quando tantas pessoas sofrem injustiças e agressões de toda ordem; segundo porque o Brasil é um país fadado a não dar certo. Como cinco séculos se passaram e não deu certo ainda, logo se conclui que nunca dará. E a razão é muito simples: foi invadido, colonizado, por ibéricos. Tomando de empréstimo uma expressão do escritor Lima Barreto, digo eu, “Este país foi feito para desanimar”.

Isso fica mais claro de se compreender racionalmente (humanamente não é possível entender como alguém se diz gente, pessoa, e comete tais atos, a não ser que isso que se chama de ser humano seja a pior coisa que existe sobre a terra) recorrendo a mais uma conclusão barretiana e observando a realidade em si. Diz ele que a política nacional age de maneira oposta ao que é o fim proposto pela política em si, ao menos em tese: “No Brasil, a política tem por finalidade tornar a vida incômoda e os povos infelizes e o objetivo dos partidos políticos e não fazer nada de útil para a sociedade”. Alguém duvida dessa verdade? E olhe que Lima Barreto morreu jovem e na miséria, claro, ousou dizer essas verdades, que ainda hoje se tem medo de dizer. Pois, a elite faz todo tipo de pilantragem, mas todos têm por ficar calado, de preferência aplaudindo-a.

Quem não ouviu falar na tragédia de Mariana? Se bem que os brasileiros estão preocupados mesmo é com Paris, Bataclan, etc e tal. Para esses que amam Paris, brasileiros pobres tem que morrer mesmo, pode-se matar à mancheia como se mata mosca. O que conta mesmo é ser branco europeu. E se for gaulois, teuto ou britânico tanto melhor. Já eu prefiro formar com Manoel Bomfim que escreveu no seu A América Latina: males de origem, “Em crueldade nenhuma raça na face da terra se iguala aos brancos europeus”. Mas os brasileiros acham que eles são angélicos. Ainda que para os europeus as mulheres brasileiras tenham quatro letras e os homens sejam vagabundos.

Pois bem, ocorreu essa tragédia programada na região de Mariana com epicentro no povoado Bento Rodrigues, por responsabilidade da empresa mineradora Samarco, testa-de-ferro de duas outras gigantes, ou melhor, monstras, do ramo de mineração. A BHP Billiton, com sede em Melbourne, Austrália e a Vale do Rio Doce, outrora nacional e a partir de 2007 foi presenteada ao estrangeiro pelo governo entreguista do PSDB. Essa tragédia criminosa, que inundou vasta região em um mar de lama, ceifou vidas de pessoas e animais domésticos, arrasou povoados inteiros, deixou centenas de desabrigados. Matou rios inteiros com seu entorno…  Muito bem, e como estão agora as vítimas vivas desse crime? Ao Deus-dará e tudo indica que assim ficarão. Porque este país não pune criminosos, não valoriza a vida nem se interessa pelo bem comum. Esse país só se especializa, há cada dia, em ladroagem, corrupção e vilanias, as mais baixas possíveis. Não foi capaz de obrigar a empresa seguir regras rígidas de segurança para proteger o povo, ou então confiscar os bens e expulsar tais empresários como cães sarnentos ou abutres que lucram com o cadáver dos pobres.

Alguém pode perguntar e a justiças. A resposta seria que a justiça também está neste país e o Estado é um só, esta teoria dos três estados sonhada e planejada por Montesquieu, no Brasil é balela. Neste país, o que impera é a justiça de classe, para condenação dos pobres e defesa dos ricos, estejam corretos ou errados. Existe sim aqui a justiça anunciada por Gregório de Matos:

E que justiça a resguarda?… Bastarda.

É grátis distribuída?… Vendida.

Que tem, que a todos assusta?… Injusta.

Valha-nos Deus, o que custa

O que El-Rei nos dá de graça,

Que anda a justiça na praça

Bastarda, vendida, injusta.

Vejamos, até agora passados mais de vinte dias o que de concreto foi feito em prol dos atingidos, inclusive da morte de rios inteiros e até de parte do oceano. De fato, até agora nada, só blá…blá…blá como tudo no Brasil se resume. O estado multou em R$ 250 milhões: ridículo, é o único comentário cabível. Dizem que a empresa prometeu R$ 1 bilhão para as pessoas atingidas: isso é uma afronta. Mas nem a multa foi paga, nem o prometido está em caixa. O que se sabe mesmo é que só em 2014 o lucro líquido dessa empresa foi de R$ 2 bilhões e 800 milhões. E mais, o dinheiro que estava na conta da empresa foi escondido. E mais ainda, um juiz de muito bom senso deu habeas corpus para o responsável da Samanco não ser preso. Com certeza nenhum da família desse juiz foi atingido, por que se tivesse sido ele não o daria. Mas se um do povo roubar um pacote de leite de 250g este mesmo juiz o mantinha trancafiado por anos a fio.

Só a título de comparação, já que seria inevitável. Em 2010, outra empresa desta vez petrolífera, a britânica British Petroleum deixou vazar milhões de barris de petróleo no golfo do México, EUA, com enorme dano ambiental, mas não destruiu povoados nem inundou região; sabendo ela que a punição não seria pequena, uma vez que os Estados Unidos, para isso, é um país de vergonha, apressou-se em fazer um acordo com a justiça estadunidense em que se comprometeu pagar, só para recuperação do meio ambiente, US$ 54 bilhões de dólares, depositando em conta imediatamente. Diferente deste país chamado Brasil, administrado por calhordas em que os estrangeiros: europeus e americanos do norte, vêm quando querem dinheiro fácil, sexo barato e pedofilia. Fazem o que querem e vão embora rindo deste porcaria. Um país em que dois estadunidenses, derrubam um avião matando 154 passageiros, vão presos, mas um juiz autoriza a soltura. E eles vão embora, é claro, acredito que também esse juiz não tinha ninguém seu no voo. Um país desse não pode mesmo ser respeitado. Porque, como disse Charles de Gaulle, ao ver o luxo do Hotel Copacabana Palace e ao fundo as favelas miseráveis: “Este não é um país sério”.

Agora, estão estes outros desamparados da sorte, porque sorte não há. O que há são países de vergonha e países frívolos como este Brasil, que vira as costas para as pessoas, entregando-as nas mãos dos carrascos estrangeiros. E os que ainda moram na região estão aterrorizados, com medo de mais duas barragens que ameaçam romper-se. Isso é terror e ninguém fala que esses meliantes são terroristas, que estão por aí usando nossa riqueza e rindo dos mortos. Se alguém quiser ver como a justiça nos EUA é aplicada com rigor contar ricas empresas, assista ao filme Erin Brokovich-Uma mulher de talento com Julia Roberts. Por aqui não, europeus e americanos do norte podem vir e farão o que quiser. Este país nunca será um país, tampouco uma nação: falta-lhe respeito. Lei aqui é só para coagir os pobres.

Para melhor definir este país, evoco uma vez mais Lima Barreto e Gregório de Matos. O primeiro diz: “A Bruzundanga era um sarcófago de mármore, ouro e pedrarias, em cujo seio, porém, o cadáver mal embalsamado do povo apodrecia e fermentava”. Esta é uma metáfora eloquente do Brasil. Enquanto o segundo falando da cidade da Bahia (Salvador) para simbolizar todo o país, dispara:

Que falta nesta cidade?… Verdade.

Que mais por sua desonra?… Honra.

Falta mais que se lhe ponha?… Vergonha.

O Demo a viver se exponha,

Por mais que a fama a exalta,

Numa cidade onde falta

Verdade, honra, vergonha.

 

Redação DiárioPB

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